“Quanto maior o poder, mais perigoso é o abuso.”
(Burke, Edmund)
RESUMO
Este
trabalho teve como principal objetivo analisar a atuação dos missionários da
companhia de Jesus na América portuguesa do século XVI. Através de sua
metodologia, observar os elogios e as críticas feitas aos mesmos ao longo da
História. A pesquisa é de cunho qualitativo tendo como principal método a
análise bibliográfica. A pedagogia do poder da companhia de Jesus, isto é, o
ensino religioso aliado aos interesses da coroa lusitana, é o principal objeto
de estudo desta obra. Analisa-se ainda os conceitos de cultura e aculturação,
tendo por base a ação da catequese e seus efeitos sobre os nativos americanos.
A finalidade é fazer uma reflexão sobre o poder do ensino sobre os alunos. É
necessário que o educador reflita sobre seu lugar na educação, sobre seus
métodos de ensino e sobre o impacto de seus atos pedagógicos sobre os alunos.
Palavras
chave: Ensino religioso – Jesuítas- Brasil- Poder-
Aculturação
ABSTRACT
This study aimed to analyze the performance of the company's mission of Jesus in Portuguese America from the six teenth century .Through its methodology ,to observe praise and criticism to them throughout history . The research is a qualitative approach with the main method bibliographic analysis. The pedagogy of the power of the company of Jesus ,that is, the teaching of religion allied to the interests of the Portuguese crown, it is the main object of study of this work. It still analyzes the concepts of culture and acculturation ,based on the action of catechesis and its effects on Native Americans . The purpose is to reflect on the power of education on students . It is necessary that the educator reflect on their place in education, on teaching methods and their impact of their actions on teaching students .
Keywords :Religious education-Jesuits- Power– Acculturation
1.
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como
principal objetivo refletir a metodologia pedagógica dos padres missionários da
companhia de Jesus nos séculos XVI-XVIII na América Portuguesa. Bem como
perceber a figura destes como agentes ideológicos, não só de uma fé, cristã, européia
e católica, mas antes disso, de uma ideologia
contextual ao qual se inseria: eurocentrismo. Tomar-se-á por base obras de
escritores como Márcia Amantino, Del Priore, Laura de Mello, Calazans Falcon,
Moacir Gadotti, Paulo Ghiraldelli Jr, Otaíza Romanelli, Arruda Aranha, Maria
Luisa Santos Ribeiro, dentre outros.
Pretende-se ao longo
deste trabalho, levar o leitor, principalmente o profissional da educação,
analisar seu lugar em sala de aula, refletindo sua postura, a partir da ação
jesuítica na colônia. Não cabe a ninguém hoje julgar o passado, todavia deve-se
extrair lições dele, de modo que nos aperfeiçoemos. Desde já, acerca da ação
missionária, a visão crítica é a principal abordagem. Mesmo porque boa parte da historiografia
registra muito mais o lado obscurantista dos métodos pedagógicos destes padres.
O Trabalho buscou
localizar no tempo- espaço a companhia de Jesus, com o intuito de facilitar a
compreensão da mesma. Quem era, pelo que lutava, a quem se dedicou, quanto
tempo atuou em terras brasílicas, sua herança e legado, isto é, a língua
portuguesa, os costumes e a moral, a catequese e a sua cultura europeia. Desse
modo o leitor poderá tirar suas próprias conclusões acerca desses agentes
educacionais e seus métodos.
Primeiramente, são
apresentados os conceitos de eurocentrismo, renascimento e iluminismo. Visto
que sem estes, não se pode entender como nasceu a companhia de Inácio de
Loyola. Bem como são resumidos os movimentos de reforma religiosa na Europa,
com Martinho Lutero. Os soldados de Cristo são fruto de uma série de eventos
que ocorreram no século XVI. Surgem como resposta da Igreja católica à reforma
protestante.
Este século é uma época
marcante na história, pois é um período efervescente de acontecimentos e
descobertas, bem como de desenvolvimento científico e cultural. Época de
colonizações e desenvolvimento mercantil, transições de sistemas econômicos e
consolidações de hegemonias.
Procura-se ao longo do
trabalho, demonstrar que os padres católicos não vieram ao novo mundo apenas
com a intenção de salvar almas perdidas, que não conheciam o Deus judaico-
cristão nem a cruz de Cristo, mas que estes missionários eram também agentes da
coroa portuguesa e sua ação foi de extrema importância para o êxito dos
interesses econômicos da Metrópole a quem serviam: Portugal.
A partir do ensino e da
educação catequética foi que a Igreja conseguiu, ainda que de maneira lenta,
fixar um novo comportamento nos nativos que aqui habitavam. Desse modo,
lança-se aqui o tema dessa monografia: Cultura e poder: uma análise da ação
pedagógica jesuítica na América portuguesa.
Quando se fala de
educação, não se pode negligenciar as questões culturais e locais do ensino,
seja por quem leciona, seja por quem aprende. Assim sendo, a perspectiva dessa
obra foi a do abuso do poder por parte dos europeus em relação aos nativos, que
por se acharem em um nível cultural desnivelado, acabaram sendo exterminados em
seus hábitos e costumes. Portanto, este é um estudo sobre ensino e aculturação,
tendo por base principalmente o ensino religioso, primeira disciplina na
história da educação brasileira.
Fez-se necessário
recorrer constantemente ao contexto histórico de cada fase do tempo em que os
padres estiveram na colônia. Desde sua vinda, até sua expulsão. Também se
observou o comportamento do padre, como arquétipo do professor, para que se
possa extrair de sua atuação algumas lições necessárias. Por exemplo, seu controle
moral sobre os comportamentos, sobre os corpos e costumes. Bem como a
predileção pelos brancos europeus e a distinção que davam às classes sociais na
colônia, diferenciando o ensino entre filhos de colonos e nativos, segregando e
afirmando os lugares sociais.
É, portanto, tema desse
estudo e uma questão a ser melhor analisada,
a cultura como dominante e cultura dominada na educação. As relações de poder
entre professor e aluno. Os discursos legitimadores de práticas pedagógicas, o
abuso do poder e a sujeição do menor em sala de aula, as manutenções de
práticas arcaicas do ensino religioso e a dogmatizarão.
Espera-se
que o leitor aprofunde-se no tema, buscando em outras fontes o complemento
daquilo que aqui não foi dito. Bem como almeja-se o despertar do senso crítico,
do questionamento dos discursos salvacionistas que na verdade estão cheios de
intencionalidades bem determinadas.
2.
O contexto histórico dos séculos XVI- XVIII para
compreensão da ação jesuítica na América Portuguesa
Não há dúvidas de que a
ação jesuítica nas terras brasílicas foi de extrema importância, não somente para
a história de Portugal, bem como para a história do Estado que dele se formaria:
o Brasil.
Quando olha-se para
trás, vê-se a fundamental contribuição destes religiosos, na formação cultural,
espiritual, ética e moral do novo mundo descoberto. É claro que esta é a
perspectiva do europeu, que via-se a si mesmo como o padrão humanista para todo
o restante do globo terrestre.
O Eurocentrismo tem sua
base ideológica no movimento cultural chamado Renascimento, que buscava reviver
o classicismo Greco- romano, através da literatura, pinturas e artes como um
todo. O europeu ocidental, era o homem “perfeito”, deveria ser admirado,
contemplado, imitado. Este paradigma motivou os mesmos a espalharem pelo mundo,
ainda que através da fé cristã, um estilo de vida bem particular.
O Renascimento surgiu
no século XV e XVI e através do humanismo, buscou forjar a imagem do homem e de
sua cultura em oposição às concepções teológicas medievais. Cabe ressaltar que
não se tratava de um movimento não religioso, todavia pretendeu superar o
teocentrismo. Aranha diz ( 2006, p. 124):
“O retorno às fontes da
cultura greco-latina, sem intermediação dos comentadores medievais, foi um
procedimento que visava também à secularização do saber “.
Todo o contexto
histórico era propício à grandes mudanças sociais. A burguesia ascendia, novas
tecnologias surgiam, os oceanos estavam sendo cruzados através de longas
viagens marítimas. A própria Igreja católica vinha sofrendo cisões desde o
século XVI, com a eleição de dois papas, um na França e outro em Roma. Bem como
a disseminação e heresias e a criação da Inquisição. Tudo isso corroborou para
as reformas que se sucederiam inevitavelmente. Sem falar das questões políticas
e econômicas que também enfraqueciam o
poder do clero, graças aos embates enfrentados com a monarquia.
A
base filosófica de tal ideologia ou paradigma alicerça-se sobre outro movimento,
muito importante, que ficou conhecido como Iluminismo. Os iluministas eram
pensadores que almejavam dissipar as “trevas” medievais da mente humana,
trazendo a razão e assim, a evolução do homem. Sobre o ensino no período do Renascimento,
Aranha diz (2006, p.125):
É
impressionante o interesse pela educação no Renascimento- sobretudo se
comparado com o manifestado na idade média- principalmente pela proliferação de
colégios e manuais para alunos e professores. Educar tornava-se questão de moda e uma exigência,
conforme a nova concepção de ser humano.
Gadotti
afirma que o ensino renascentista era exclusivista, visava a formação de poucos
( 2006, p. 62):
A
educação renascentista preparou a formação do homem burguês. Daí a educação não
chegar às massas populares. Caracterizava-se pelo elitismo, aristocratismo e
individualismo liberal. Atingia principalmente o clero, a nobreza e a burguesia
nascente.
Novos tempos, novos
paradigmas e novas maneiras de interpretar o mundo. Até mesmo a concepção de
infância é alterada. Crianças passam a ser separadas dos adultos, não
aprenderiam apenas conhecimento científico, mas seriam formados moralmente.
Vale ressaltar que inicialmente a secularização do humanismo fora bem teórico.
Visto que a Igreja ainda implantava a maioria dos colégios. Contudo, vê-se na
figura de Lutero, principal reformador da época, um embate pela laicização do ensino.
Segundo Aranha ( 2006, p.127):
“Lutero defendia a educação universal e
pública, solicitando às autoridades oficiais que assumissem essa tarefa, por
considerá-la competência do Estado”.
Desse modo,
compreender-se-á a atuação jesuítica na América Portuguesa e sua reprodução
cultural européia em terras brasílicas. A cópia de todo o aparato
renascentista, humanista e iluminista de seu tempo.
Acerca
do iluminismo deve-se ainda refletir. Ghiraldelli Jr ( 2006, p.26) caracteriza
o iluminismo da seguinte forma :
“O
iluminismo ou, mais exatamente, a ilustração, corresponde ao período do
pensamento europeu caracterizado pela ênfase na experiência e na razão, pela
desconfiança em relação à religião e às autoridades tradicionais, e pela
emergência gradual do ideal de sociedades liberais, seculares, e democráticas
“[...]
O autor segue
citando (p.27):
“[...] o iluminismo
está associado a uma concepção materialista dos seres humanos, a um otimismo
quanto ao seu progresso por meio da educação e uma perspectiva geral utilitária
da sociedade e da ética. [...]
Não se deve pensar que
o Iluminismo apenas influenciou sua época. Para José Calazans Falcon, o
iluminismo permanece atual. Não foi apenas uma das causas da Revolução
Francesa, também não deve ser reduzido a uma lista de nomes de grandes
intelectuais. De acordo com Falcon (2009, p.6):
“Para o mundo de hoje o
iluminismo é algo bastante presente, tanto que é capaz de produzir debates e
tomadas de posições dos mais variados tipos.”
Desse
modo, prefere-se compreender o iluminismo como a culminação de um processo, ou
como um começo, iniciado com o renascimento e tendo em seu auge a revolução científica
do século dezoito.
Sobre
as ambiguidades do iluminismo, Falcon acrescenta( 2009,p. 17):
Sabemos
que iluminismo tanto pode significar a doutrina dos que acreditam na
“iluminação interior’ ou mística, a qual para os outros constituía uma espécie
de manifestação irracionalista, quanto justo o oposto, iluminismo é sinônimo de
filosofia das luzes, isto é, da chamada iluminação racional. Lembremos, só para
exemplificar, que no setecentos luso, os textos utilizavam muito “luzes” e
“iluminados” quando se referem às ideias que chamamos iluministas. Todavia,
dependendo do contexto, “iluminados” eram também os místicos que, em Espanha,
são conhecidos como “alumbrados.
Percebe-se de acordo
com a citação acima que o termo iluminista tanto era usado com novo
significado, luz da razão, como de modo místico, o mais tradicional, isto é, se
referindo a temáticas espirituais.
Não somente isso é
complexo em relação ao movimento das luzes, até mesmo os historiadores divergem
quanto a data de seu surgimento, por exemplo. Não é fácil delimitar seu espaço-
tempo. Alguns o associam com a revolução científica do século dezessete e ou à
crise de consciência européia, século dezoito.
O que pode-se afirmar é
que a enciclopéia é, por assim dizer, o símbolo do apogeu deste movimento, que
se deu em 1740- 1770. Sendo a década de 60 conhecida como a primavera das luzes,
visto que toda a Europa fora abraçada pelo mesmo.
Ainda sobre as
divergências históricas sobre o iluminismo, Falcon ( 2009, p. 22) diz:
Os
vinte anos que precedem a Revolução de 1789 marcam a etapa final do iluminismo.
É a época em que se acirram os debates e mais do que nunca se aprofundam as
divergências entre utopia e reforma. Para os historiadores do iluminismo em
geral, a Revolução é o ponto final do movimento ilustrado. Mas trata-se de um
problema ainda em aberto; continuidade e ruptura entre iluminismo e Revolução?
Portanto, resta ao
leitor, a partir da contextualização do cenário ao qual se inseria esse
missionário pedagogo, questionar sua ação. Aferir seus discursos, ponderar suas
metodologias e averiguar suas consequências no ambiente onde atuaram.
Deve-se sim duvidar e
questionar os discursos. Todavia, não cabe aos pesquisadores julgarem ou
rotularem os missionários jesuítas como bons ou maus. Não é papel do
historiador medir o passado com os olhos do presente.Agora, resta a análise dos
fatos históricos para a melhor compreensão do que motivou a ação missionária na
colônia portuguesa, bem como suas contribuições para a formação do povo
brasileiro e para a educação aqui implantada.
Sendo assim, a História
conta que os jesuítas chegaram ao novo mundo em 1545. Foram os responsáveis
pela criação da primeira rede de ensino no país e pela construção de numerosas obras,
que objetivavam integrar as culturas européias e indígenas. Sua atuação fora
radical e imediata, visto que fora fundada por Inácio de Loiola em 1534,
aprovada pelo Papa Paulo III, em 1540. Cinco anos depois,seus missionários já
estavam em terras coloniais cooperando com a coroa portuguesa. Aranha (2006, p.
127) diz que
“A ordem estabelecia
rígida disciplina militar e tinha como objetivo inicial a propagação
missionária da fé, a luta contra os infiéis e os heréticos”
O Contexto de seu
surgimento se deu em meio a disputas religiosas contra os luteranos, reformadores
insatisfeitos com a estrutura eclesiástica católica. Os seguidores de Lutero
ganhavam cada vez mais espaço na Europa, o que começou a preocupar a Igreja
Católica. Essa, afim de recuperar o espaço perdido para os protestantes, lança
o movimento de Contra reforma. Os Jesuítas surgem como combatentes da nova fé,que
questionava a autoridade papal, as indulgências e o papel da igreja na sociedade.
Portanto, o missionário jesuíta é a tentativa de reacender o catolicismo em
declínio.
Segundo Gadotti ( 2006,
p. 64) acerca dos movimentos religiosos que agitavam a Europa do século XVI:
“À reforma protestante,
a igreja católica reagiu através do concílio de Trento (1545- 1563), [...],
através da companhia de Jesus (1534), organizou a inquisição (1542) para
combater o protestantismo e toda forma herética de doutrina cristã .
Os missionários
Inacianos viram na educação e no ensino, sua principal ferramenta de combate ao
protestantismo. Aranha ( 2006, p. 129) afirma que
“Os jesuítas
tornaram-se famosos pelo empenho em institucionalizar o colégio como local por
excelência de formação religiosa, intelectual e moral das crianças e
jovens[...] .
Para alguns, os padres
promoveram uma separação entre escola e vida. Eram excessivamente dogmáticos,
autoritários e bem comprometidos com a Inquisição. Foram acusados de enriquecer e de exercer poder político
sobre os governos.
Ainda sobre a ação
pedagógica dos padres,em comparação com o que já se percebia na Europa, Gadotti
( 2006, p.65) afirma:
“A educação jesuíta
encaminhou-se principalmente para a formação do homem burguês, descurando a
formação das classes populares. Seu fundador, Inácio de Loyola, também era de
família burguesa [...] .
Desse
modo, percebe-se que os missionários transportaram a visão do mundo europeu
para a colônia portuguesa. Isto é, assim como na Europa, os jesuítas, focaram seus
esforços pedagógicos na elite branca católica. Geraram desse modo, um
desnivelamento social. Ora, se observa-se um Brasil hoje com desigualdades de
classes, seja na área econômica ou cultural, não resta dúvidas que a raiz disso
tudo advém deste período. Gadotti ( 2006, p. 65) prossegue enfatizando:
Os
jesuítas desprezaram a educação popular. Por força das circunstâncias tinham de
atuar no mundo colonial em duas frentes: a formação burguesa dos dirigentes e a
formação catética das populações indígenas. Isso significava: a ciência do
governo para uns e a catequese e a servidão para outros. Para o povo sobrou
apenas o ensino dos princípios da religião cristã.
Os Jesuítas atuaram em
terras brasílicas por duzentos e dez anos, isto é, de 1545 à 1759. A língua
portuguesa é falada no Brasil por causa de sua catequese aos indígenas e aos
filhos dos colonos portugueses que para cá desciam. A fé católica é predominante
nos dias atuais porque foram eles quem insistentemente discipularam os
habitantes da América portuguesa quinhentista. Eles chegaram por aqui sob o governo
de Tomé de Souza. Eram chefiados por Manoel de Nóbrega e José de Anchieta. Eram
perspicazes, e se dedicaram mais arduamente ao ensino de índios mirins, visto
que os mais velhos resistiam aos novos costumes.
Nessa perspectiva os
jesuítas eram ativos em sua missão, enquanto se fundava a cidade de Salvador,
quinze dias depois de sua chegada, uma escola já funcionava. E onde quer que
fundassem uma igreja, havia uma escola. De modo que da Bahia para o Sul, São
Vicente, sob o assim denominado Apóstolo da Educação, Manoel Nóbrega, o ensino religioso
católico ia se espalhando.
Os
Jesuítas criavam aldeamentos, que eram comunidades indígenas, distantes dos
brancos, para facilitar sua atuação.Também visavam transformar o índio em
agricultor e mão de obra produtiva. Todavia, o indígena era nômade, não tinha o
hábito de permanecer muito tempo alojado em um mesmo lugar. Combatiam os
costumes nativos, como poligamia e antropofagismo, e impunham as virtudes
cristãs através da formação intelectual e dos ritos católicos. Tinham uma
metodologia bem específica para ensinar a moral cristã. Utilizavam música,
teatro, formavam compêndios, tudo para facilitar a aprendizagem dos curumins.
Segundo Aranha ( 2006, p. 131):
[...]
O antropólogo brasileiro Luiz Felipe Baêta Neves, a propósito da catequese dos indígenas,
comenta que a companhia de Jesus foi fundada para difundir a Palavra,
especialmente para povos que não a conheciam. Dirigiam-se a homens que não são,
portanto, iguais a si, e quer transformá-los para incorporá-los a cristandade
[...] A catequese é, então, um esforço para acentuar a semelhança e apagar as
diferenças [...]
Divide-se a história da
ação jesuítica na colônia portuguesa em pelo menos duas fases. A heróica, de
1549-1570, que é a catequese propriamente dita. E a fase de consolidação, de
1570 – 1759, em que ocorre a expansão do ensino secundário nos colégios. Após
isso, ocorre o que ficou conhecido como Reformas pombalinas, de 1759- 1808, em
que o ensino passou a ser público e secular. E então, de 1808 – 1822, vê-se o
que os historiadores chamam de período Joanino.
Ghiraldelli
Jr (2006,p.24), em História da educação brasileira, também divide o ensino
colonial em fases. Segundo ele o Brasil foi colônia de Portugal de 1500 a 1822.
O autor citado acima:
A
educação escolar no período colonial, ou seja, a educação regular e mais ou
menos institucional de tal época, teve três fases: a de predomínio dos
jesuítas, a das reformas do Marquês de Pombal, principalmente a partir da
expulsão dos jesuítas do Brasil e de Portugal em 1759, e a do período em que D.
João II, então rei de Portugal, trouxe a corte para o Brasil (1808- 1821)
Cabe agora o questionamento:
o que levou Portugal a fazer tão grande empreendimento em terras tão longínquas?
Aranha ( 2006, p.139) diz que
[...] a colonização
resultou da necessidade de expansão comercial da burguesia enriquecida com a
revolução comercial[...]
É importante dizer que Portugal
não acompanhou o desenvolvimento comercial de outros países europeus como
França e Inglaterra. Seu atraso se deu porque esteve ocupado e atrelado aos
interesses reais e não mercantis. Além do que conservou uma mentalidade
medieval e extremamente católica. Por isso, retardou a implantação do capitalismo,
recriminando o lucro através da cobrança de juros. Enquanto ao sistema de
colonização, limitou-se a exploração do pau- brasil ao invés de metais
preciosos. Bem como perseverou em extrair a cana-de açúcar, investindo em
latifúndio, monocultura e escravismo. Tudo isso fez com que os demais países
passassem bem na frente de Portugal na disputa pela hegemonia econômica
mundial.E qual era o papel dos religiosos enviados da Metrópole para a colônia portuguesa?
Aranha ( 2006, p. 139) diz:
[...] As metrópoles européias
enviavam religiosos para o trabalho missionário e pedagógico, com a finalidade
principal de converter o gentio e impedir que os colonos se desviassem da fé
católica [...]
O padre assumia assim
um papel de muita importância na sociedade colonial. Ele era, por assim dizer,
a massa de ligação, entre os moradores do novo mundo com os portugueses vindos
da Metrópole, bem como preservava os costumes lusitanos e cristãos. O Padre era
o freio moral para uns, e o instrumento aculturador para outros. Sua atuação,
de forma sutil ou não, cooperava e muito com os interesses da coroa. Aranha ( 2006, p.139) diz que
[...] A atividade
missionária facilitava sobremaneira a dominação metropolitana e nessas circunstancias,
a educação assumia papel de agente colonizador
Mais uma vez, percebe-se
o quanto a educação é capaz de transformar o meio e aqueles que lhe
pertencem. Não se quer dizer com isso
que a atuação jesuítica fora apenas benéfica. Pretende-se apenas fomentar a idéia
de muitos pensadores da educação sobre o poder aculturador do ensino. Neste
caso, o ensino religioso através da catequese jesuítica no Brasil colônia.
O
Padre, é portanto, um agente externo que traz consigo, sob a premissa de uma
missão divina, a de “ide por todo mundo e pregai o evangelho a toda criatura”,
segundo as palavras de Jesus de Nazaré no Evangelho que escreveu Mateus, todo
um código que é imposto de cima para baixo aos índios que aqui viviam. Não
somente os nativos indígenas sofreram a ação educadora cristã dos padres jesuítas,
os negros africanos também estavam sob o mesmo regimento. Aranha ( 2006, p.141) escreve:
[...]
O sociólogo brasileiro contemporâneo Gilberto Freyre, na obra Casa- grande e
Senzala, diz que os primeiros missionários substituíam as ‘cantigas lascivas”,
entoadas pelos índios, por hinos à virgem e cantos devotos, condenavam a
poligamia, pregando a forma cristã de casamento. Dessa maneira, começaram a
abalar o sistema comunal primitivo.
As
missões foram bem sucedidas no aspecto em que se percebeu uma mudança no
comportamento do índio. Isto é, seus espaços geográficos, família e horários
foram alterados progressivamente. Questões de descanso e trabalho também
mudaram. Sem falar do poder sobre seus corpos, como a higiene e a sexualidade.
Arruda Aranha ( 2006, p. 144) diz:
Pela
atuação constante até o século XVIII, não só entre os nativos, mas sobretudo na
sociedade colonial, podemos dizer que os jesuítas imprimiram de modo marcante o
ideário católico na concepção de mundo dos brasileiros e consequentemente introduziram a tradição religiosa de ensino
que perdurou até a República “.
Os duzentos e dez anos
de atuação pedagógica jesuítica possibilitaram a “uniformização” da cultura,
através do abafamento das diferenças. Educação conservadora e cristã,
ministrada basicamente pela mesma companhia por dois séculos, resultou o que
hoje chama-se povo brasileiro. Que se deu com a mistura de povos, credos e
costumes, juntamente com o poder transformador da catequese católica, sob a supervisão
quase militar dos Inacianos.
Agora, sobre a rigorosidade
Inaciana. Segundo os missionários católicos, muitas indecências e imoralidades
eram observadas entre os nativos. Eles tinham o novo mundo como um paraíso sem
gerência. Logo, lançaram seus olhares sobre aquilo que consideravam o principal
objeto do pecado na colônia: o corpo nu do indígena. Portanto, o empreendimento
colonial necessitava de uma mutação no comportamento moral dos nativos.
Muitas
interpretações foram feitas acerca da nudez dos índios, alguns a viam com
inocência e símbolo da pobreza em que viviam, outros a viam como pecado.
Segundo Priore (2011, p 17):
Vesti-lo
era afastá-lo do mal e do pecado. O corpo nu era conhecido como foco de
problemas duramente combatidos pela igreja nesses tempos: a luxúria, a
lascívia, os pecados da carne. Afinal, como se queixava o padre Anchieta, além
de andar peladas, as indígenas não se negavam a ninguém.
Logo,
começou-se a entregar aos índios, peças de roupas. Pode-se, portanto, como diz Oliveira (2011, p 45), dizer sobre o cristianismo:
Na
história do cristianismo, as referências ao corpo aparecem como uma variável
constante. Todavia, elas não assumem um caráter uniforme, pois ora o corpo é
elemento de salvação- o de Cristo- ora pode levar a danação, se sobre ele não
se estabelecer uma constante vigilância e por vezes, um menosprezo e um
desapego.
Todavia,
o que mais se observava na colônia era exatamente o uso do corpo com liberdade
por parte dos nativos. A igreja teve de
esforçar-se e muito para reverter os costumes indígenas. Para Oliveira ( 2011,
p. 67-68):
[...]
a corporização da santidade foi expressão de diversas apropriações do sagrado e
um elemento a reforçar a ordem social vigente, que procurou aproximar os fiéis
de um Cristo concreto e com isso colocá-los diante da orientação e da submissão
à Igreja. Tal se constituiu em uma instituição fundamental da formulação e
veiculação de valores socioculturais e políticos conformadores de uma sociedade
escravista e excludente. Ou seja, corpo santo, sociedade santificada, defesa da
ordem e do respeito à Igreja.
Para exemplificar
melhor os modelos de moralidade e conduta, a Igreja usou os santos católicos
para doutrinar os índios. Pode-se dizer que tais santos serviam para tornar a
santidade onipresente. Foram muito importantes no processo aculturador.
Assim, como diria Souza
(2009, p 95):
[...] conforme se
iniciou a ação dos soldados de Cristo, passaram a existir índios e índios, e
índios conversos, sujeitando-se estes a Deus, e aqueles ao diabo [...]
É
claro que as reações foram as mais diversas no que diz respeito a ação
missionária a partir dos nativos. Não se deve imaginar que todos aceitaram
pacificamente as imposições católicas. Como diria Márcia Amantino (2011,
p 22) sobre os grupos de índios existentes na colônia:
O
primeiro seria dos mansos, pacíficos e que aceitaram a catequese e o posterior
aldeamento. Viviam no litoral, perto dos aglomerados coloniais. Exerciam
atividades ligadas ao trabalho e prestavam serviço à sociedade. Geralmente eram
identificados com os Tupis. Também havia aqueles que viviam no interior, longe
do litoral, nos sertões. Eram os tapuias, identificados como grupos hostis, que
não aceitavam aproximações com os colonos, a catequese e o aldeamento e muito
menos o trabalho nas fazendas. Entre uns e outros, a inimizade e as guerras.
Todavia, os conflitos também ocorriam no interior de cada um dos grupos.
Outro fato histórico
que não se pode negligenciar nessa obra, e que demonstra o abuso do poder por
parte dos missionários, é o extermínio dos índios que não se adaptavam à vida
“proposta” pelos padres inacianos.
Assim sendo, e talvez
por conta disso, o lado sombrio e obscurantista prevaleceu na historiografia da
educação e do ensino no Brasil. Como se sabe, muitas críticas foram feitas ao
militares de Cristo, que vieram a serviço da coroa lusitana, a fim de recuperar
território religioso, bem como beneficiar os cofres do rei de Portugal. O fato
é que deve-se ponderar toda a ação pedagógica destes religiosos na América
portuguesa, separando aquilo que hoje considera-se bom e ruim, a partir da nova
ótica educacional.
3.
Educação religiosa feita pelos missionários da
Companhia de Jesus na colônia portuguesa e sua expulsão
Muito se escreveu sobre
os métodos pedagógicos dos missionários da companhia de Jesus. Sua atuação intensa,
de fato, deu uma nova identidade à gente que morava aqui. Portanto, o educador deve
compreender sua atuação e perceber o poder que possui. Deve também analisar os
métodos que utiliza, e então enxergar a melhor maneira de lecionar. Na história
do ensino religioso, notou-se o abuso do poder, de acordo com a maior parte das
fontes, e o uso da imposição dogmática, sem respeitar as peculiaridades das
culturas, julgando-as como” carnais e diabólicas”, sob a ótica judaico-cristã.
Existe, portanto, uma
predominância historiográfica quando se trata da ação jesuíta, em avaliá-la de
modo negativo, como já mencionado. Seu principal crítico é o português ilustre
Luís Antônio Verncy, autor de “O verdadeiro método de estudar, 1746.” O missionário da companhia de Jesus é visto
como um vilão, agente da coroa portuguesa, associada a Igreja Católica. Ele é encarado
como mal porque violenta a vontade indígena, fere sua cultura e acima de tudo o
explora como mão de obra barata. A ação desses educadores passa a ser
questionada por seus próprios membros, que vêem na proliferação de suas
escolas, o abuso da parte de alguns padres.
O problema se dá pelo
tratamento diferenciado dado pelos jesuítas aos habitantes da colônia. Os
colonos recebiam melhor assistência do que os índios, o que acabou gerando uma
divisão entre aldeias e povoados. Isso passou a ocorrer a partir da segunda
leva de missionários enviados à América portuguesa em 1560. Por isso se diz que
a primeira comissão missionária era mais benevolente com os pagãos. Esse fato
só reforça a vilania atribuída aos jesuítas com o passar do tempo e sua fama de
injustos. Inclusive, em questões culturais, a primeira leva era considerada
mais tolerante com os costumes nativos, permitindo até mesmo uma mistura de
ritos e melhor aceitação destes. Tanto que se diz que os aldeamentos eram uma
boa forma de explorar os nativos, aculturá-los e amansá-los. Todavia, também se
diz que estes aldeamentos eram refúgio para índios fujões, que temiam os
brancos portugueses. Portanto, conclui-se que a figura do jesuíta é controversa
na História. Ora, ele é demonstrado como associado aos interesses políticos de
Portugal, ora, ele é símbolo de acolhimento e amor cristão.
Uma coisa não se pode negar:
a história da educação no Brasil é dividida em tuas etapas, antes e depois da
expulsão dos jesuítas pelo Marquês de Pombal em 1759. Ora, ainda que boa parte
das produções sobre esses padres os apresentem de maneira obscurantista,
deve-se questionar essa visão também. Até mesmo porque outras ordens religiosas
atuaram juntamente com os missionários de Jesus, como os Franciscanos,
carmelitas, beneditinos. Todavia, a ordem que mais se destacou foi a de Inácio
de Loiola.
Essa companhia era
conhecida como resistente à mudanças, sendo classificada como extremamente
conservadora. Eles ensinavam as primeiras letras e depois o Ratio Studiorum (fundamental,
médio e superior), que era formado por letras, filosofia, artes e teologia.
Gadotti ( 2006, p. 72),
sobre a rattio studiorum, afirma:
A rattio studiorum é o
plano de estudos, de métodos e base filosófica dos jesuítas. Representa o
primeiro sistema organizado de educação católica. Foi promulgada em 1595,
depois de um período de elaboração e experimentação.
O curso de Letras durava dez anos. Era
composto de gramática, humanidades, retórica, grego, cronologia, história e
geografia. O Curso de Filosofia e artes durava três anos e sete meses.
Geralmente para aqueles que desejavam a vida eclesiástica. Compunha-se de
dialética, lógica, física, metafísica. O curso de Teologia era o de maior
nível. Durava quatro anos. Compunha-se de teologia escolástica, sagrada
escritura, hebreu, casuística. As aulas exigiam grande preparo dos professores
e ótima memória dos alunos, visto que utilizavam bastante o método decorativo.
Os jesuítas também exploravam muito o conhecimento através de disputas orais.
Sua metodologia era repetir e imitar textos clássicos, gregos e latinos.
Baseava-se na religiosidade católica, obviamente. E era voltada principalmente
para a elite colonial. Fundamentava-se em Aristóteles e São Tomás de Aquino.
Havia até um haxioma português que recomendava nunca se apartarem de
Aristóteles.
A pedagogia jesuítica
se opunha radicalmente ao espírito científico emergente. Refutava o
experimentalismo, era universalista, não dando tanta importância as
especificidades coloniais, com exceção, no entanto, do ensino da língua
tupinambá. Todavia, não é porque se opunha ao novo conhecimento, que lhe estava
alheio.
Deve-se olhar para esse
agente da fé católica de maneira que se perceba nele um objeto poderoso, tanto
para os interesses econômicos da coroa lusitana, como para os interesses da
religião cristã católica, que encontrava-se ameaçada na Europa. Portanto, é fundamental
apreender a importância histórica do padre jesuíta em terras coloniais a partir
do século dezesseis. Para Mattos (1958, p. 31)
A catequese era de
fundamental importância para o êxito do empreendimento colonial. Só através da
aculturação sistemática e intensiva do indígena é que Portugal lançaria raízes
profundas e definitivas aqui.
Não se pode esquecer
que o regime de capitanias hereditárias encontrava-se em série crise. O Governo
Geral é criado com o intuito de auxiliar as mesmas. Dom João III, vê nos padres
Jesuítas a mão necessária para fortalecer a colonização. Visto que a
organização escolar seria a ferramenta básica para consolidar o modelo agrário exportador
dependente entre metrópole e colônia.
Sabe-se
que educação e política andam de mãos dadas. Por isso aqui é pertinente a indagação:
O que motivou a colonização? A resposta é simples: interesses capitalistas da burguesia
mercantil que necessitava de mão de obra barata. A função do Jesuíta era
amansar os nativos para forjar neles bons trabalhadores. Estes padres deveriam
manter seus olhos focados nos indígenas, educá-los e catequizá-los. Todavia,
acabaram se dedicando mais aos colonos e seus filhos, por interesses
particulares. Ribeiro ( 2003, p.22) diz:
Nota-se
que a orientação contida no Ratio, que era a organização e o plano de estudos
da companhia de Jesus, publicado em 1599, concentra sua programação nos
elementos da cultura europeia. Evidencia dessa forma um desinteresse ou constatação
da impossibilidade de instruir também o índio.
Logo, os investimentos feitos pelos
padres, destinavam-se quase sempre em pontos estratégicos, isto é, nos filhos
dos colonos, que seriam os futuros sacerdotes da ordem. Portanto,
Verifica-se desta
maneira, que os colégios jesuíticos foram instrumento de formação da elite
colonial (2003, P.23). Prossegue a autora.
Assim, pode-se afirmar
que o plano Real se distanciou do plano legal, feito pelos padres. Desse modo,
os nativos seriam apenas catequizados, objetivando apenas formar novos adeptos
do catolicismo. Ribeiro ( 2003, P.24) afirma:
A elite era preparada
para o trabalho intelectual segundo um modelo religioso, mesmo que muitos de
seus membros não chegassem a ser sacerdotes [...]
É tão evidente a diferenciação que os padres
faziam dos habitantes da colônia, que houve um episódio em que os moços pardos,
rejeitados pelas escolas, foram aceitos apenas em 1689, porque foram obrigados
a serem admitidos. A companhia de Jesus, viera às terras brasílicas com um
discurso salvacionista, em nome da fé, pregar e proteger o catolicismo,
todavia, suas ações descriminavam e distinguiam as pessoas que os
circuncidavam. Ribeiro ( 2003, p. 25) prossegue:
[...] a formação
intelectual oferecida pelos jesuítas, e portanto, a formação da elite colonial,
será marcada por uma intensa rigidez na maneira de pensar e consequentemente,
de interpretar a realidade.
Como
já dito outrora, a companhia de Jesus era extremamente conservadora. Marcada
pelo isolacionismo intelectual moderno, isto é, não dialogava com novos
paradigmas científicos. Também fomentava em seus discípulos a idéia de que o
mundo civilizado era o de fora da colônia, gerando assim um espírito superior
nos mais letrados, e fazendo-os querer ir para Europa, consequentemente.
O espaço da companhia de Jesus só
crescia e sua atuação se expandia e tomava proporções cada vez maiores. Estavam
aqui para conquistar um capital capaz de transferir a etapa mercantil para a
indústria do regime capitalista. Ribeiro ( 2003, p. 28):
A importância
social destes religiosos chegou a tal ponto, que se transformaram na única
força capaz de influir no domínio do Senhor de Engenho. Isto foi conseguido não
só através dos colégios, como do confessionário, do teatro e particularmente,
pelo terceiro filho, que deveria seguir a vida religiosa
Claro
que todo esse poder conquistado não deixaria a coroa em estado de passividade.
A coroa requereu o governo de volta. Alegou que os jesuítas educavam para seu
próprio benefício e não para o desenvolvimento do país. Ribeiro ( 2003, p. 33) diz:
A companhia de Jesus é
atingida diretamente e chega a ser expulsa em 1759. O motivo apontado era o
fato de ela ser um empecilho na conservação da unidade cristã e da sociedade
civil .
Através
do Marquês de Pombal, considerado um reformador educacional, na história do
ensino no Brasil, vê-se agora com a expulsão dos jesuítas, o surgimento de um
novo modo de educar. Segundo Ribeiro ( 2003, p. 33):
Surge com isso, um
ensino público propriamente dito. Não mais aquele financiado pelo Estado, mas
que formava o indivíduo para a Igreja, e sim financiado pelo e para o Estado.
Claro que se fazia necessário
mudanças radicais em toda a estrutura governamental da colônia. O cenário
mundial estava mudando. A economia e o mercado estavam sendo monopolizados pela
Inglaterra. Daí a “importância” e a urgência nessas reformas. A autora prossegue
( 2003, p. 35):
Assim,
fica evidenciado que as Reformas pombalinas visavam transformar Portugal numa
Metrópole capitalista, a exemplo do que a Inglaterra já era há mais de um
século. Bem como, provocar algumas mudanças no Brasil, com o objetivo de
adaptá-lo, enquanto colônia, à nova ordem pretendida em Portugal
O
século XVIII foi um período de grandes
mudanças com certeza. Ideais liberais surgiam na Europa, revoluções burguesas,
o capitalismo industrial florindo e se consolidando cada vez mais na Inglaterra.
E Portugal via-se extremamente submetido àquele, através de acordos
protecionistas, em troca de relações comerciais.
Na
colônia Portuguesa vê-se antes desse período a mudança de pólo econômico, do
nordeste para o sudeste, em Minas Gerais. Só agora Portugal se propunha
explorar materiais preciosos. Toda a riqueza das minas ficavam nas mãos dos
ingleses. Serviam como pagamento de dívidas. É verdade que as condições enfrentadas
pelos lusitanos não eram tão favoráveis, visto que de 1580 à 1640, estavam sob domínio
espanhol. Ocorreram invasões holandesas em Pernambuco, bem como resistência
quilombola
Em
1759 os padres da companhia de Jesus são expulsos das terras coloniais. Cerca
de treze anos após esse fato, vê-se a implantação do ensino público. Num
contexto global, os Estados Unidos da América consegue sua independência e a
França deflagra uma grande revolução, em 1776 e 1789, respectivamente.
Sobre
a expulsão dos missionários Inacianos, Aranha ( 2006, p.191) diz:
Após
a expulsão dos Jesuítas, os bens dos padres foram confiscados, muitos livros e
manuscritos importantes destruídos. Segundo alguns historiadores, de início o
desmantelamento da estrutura educacional montada pela companhia de Jesus foi
prejudicial, porque de imediato, não se substituiu o ensino regular por outra
organização escolar, enquanto os índios, entregues á sua própria sorte, abandonavam
as missões.
Desse
modo, de imediato, as reformas educacionais pombalinas para a colônia teriam
fracassado. Sobre a estrutura ou espaços de ensino. Aranha ( 2006, p.192) diz que:
Não podemos imaginar
alunos assistindo a aulas em prédios escolares, como hoje, porque os lugares de
estudo eram improvisados [...].
É
obvio que não se pode achar que de uma hora para a outra um sistema
substituiria o outro de modo “perfeito”. Como acabou de se vê, nem mesmo as
estruturas escolares estavam determinadas. A figura clerical era muito forte na
história do ensino. Suas igrejas, seus colégios vizinhos aos templos, eram na
maioria os espaços de aprendizagem. Por isso mesmo Aranha ( 2006, p. 193) prossegue
afirmando:
Embora a reforma
pombalina não tivesse repercutido de imediato na colônia, foram lançadas as
sementes de um novo processo que iria amadurecer aos poucos a partir do século
seguinte .
É importante se compreender o quanto o ensino
e a educação moldam as culturas. Ao longo da História se percebe movimentos de
“reformas educacionais” que contribuíram para mudanças estruturais no seio da
sociedade. Exemplo disso é a transição do ensino pagão para o ensino cristão,
pós queda do Império Romano. As escolas leigas continuaram funcionando, ainda
que por pouco tempo. Os colégios religiosos, erguidos ao lado de mosteiros e
catedrais, substituíram as antigas escolas, bem como, os religiosos aos antigos
mestres. Aranha ( 2006, p. 106) diz em “História da educação brasileira e da
pedagogia” que:
Criar escolas não era a
finalidade principal dos mosteiros, mas a atividade pedagógica tornou-se
inevitável à medida que era preciso instruir novos irmãos.
Na
idade média os mosteiros assumiram o monopólio da ciência. Suas bibliotecas
depositavam a cultura grego latina. Foi no século oitavo que o ensino e a
aprendizagem declinaram, devido a necessidade do Estado em relação ao clero em questões
administrativas. Porém, outra reforma seria feita, agora por Carlos Magno, no
século nono. Era o renascimento Carolíngio que buscava através do ensino
palatino, reformar todo o sistema de ensino eclesiástico.
Outro
fato histórico que também viabilizou o ensino secular na Europa foi a consolidação
da Burguesia no século XII. Com ensino da língua local, história, geografia,
ciências naturais. E assim como posteriormente fez o Marquês de Pombal no
século dezoito em terras coloniais portuguesas,rompendo com o clero, com o
pretexto de que a Igreja educava para si, os burgueses afirmavam que o ensino
secular deveria priorizar a sociedade e não a Igreja. Essa briga entre Estado e
clero se acentuou quando se tratou de quem controlaria as primeiras
universidades.
4.
O conceito de cultura: reflexão sobre o poder aculturado
no ensino, sobre os discursos acerca do nativo e as práticas aculturadoras
É
sobre cultura, escola e ensino que o educador deve focar seu olhar para compreender
seu papel como pedagogo e mestre na vida e em sala de aula. Romanelli
em“História da educação no Brasil”, ( 1999, p.20): discute o conceito de
cultura. :
[...]
cultura é muito mais do que aquilo que a escola transmite e até muito mais do
que aquilo que as sociedades determinam como valores a serem preservados
através da educação. Podemos afirmar com Max Scheler que cultura é humanização.
E humanização aqui, tanto se refere ao processo que nos faz homens, quanto ao
fato de que bens culturais também se humanizam. A história do homem, como
história da cultura, é assim, o processo de transformação do mundo e simultaneamente
do homem.
A
autora prossegue (1999, p.20)
[...] cultura se define como algo muito mais
abrangente do que o simples resultado da ação intelectual do homem; ela é o
próprio modo de ser humano, o mundo próprio do homem
Desse modo não há neste
globo, Homem algum que não seja dotado de uma cultura, visto que cultura não
tem a ver apenas com intelectualidade. Não se fala aqui sobre ser culto ou
educado. Todavia, pretende-se mesclar esse conceito moderno de cultura com a
atuação pedagógica dos missionários jesuítas em terras brasílicas, a fim de
refletir sobre as ações impensadas, muitas vezes, de educadores que negligenciam
as culturas locais de seu alunado. Nesse caso, sobre a disciplina do ensino
religioso propriamente dito, a maneira como cada criança apreende o divino ou a
manifestação de sua religiosidade não deve ser esquecida pelo profissional educador.
Romanelli
( 1999, p.21), ainda sobre o conceito de cultura, diz:
[...]
a cultura está intimamente ligada a uma situação concreta e objetiva: ela se
faz num tempo e num espaço determinados. Ela não é independente das
circunstâncias. Ela tem uma razão de ser em função dessas circunstâncias
criadoras. Fora delas, a cultura desenraiza-se e tende a cair no mero
formalismo ritual, vazio de conteúdo. É o que ocorre muitas vezes com o processo
de aculturação.
Ainda
sobre cultura, Caldas ( 2008, p.13) em Conceito de cultura afirma:
[...]
Originalmente, essa expressão vem do latim – colere- e significa cultivar. Com
os romanos, na antiguidade, a palavra cultura foi usada pela primeira vez no
sentido de destacar a educação aprimorada de uma pessoa, seu interesse pelas
artes, pela ciência, pela filosofia, enfim, por tudo aquilo que o homem vem
produzindo ao longo da história. Nesse aspecto, a abrangência do termo
tornou-se, de lá até nossos dias, cada vez maior, sendo aplicado nas mais
diversas situações, ou seja, para o plantio de um produto agrícola, o cultivo
da pesca, a criação de animais etc., até o trabalho científico podemos aplicar
ao termo cultura.
O
autor citado acima (2008,p.13) continua
desenvolvendo o conceito de cultura e recorre ao dicionário da língua
portuguesa, de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, que diz:
[...]
cultura é: o complexo dos padrões de comportamento, das crenças, das
instituições e doutros valores espirituais e materiais transmitidos
coletivamente e característicos de uma sociedade; civilização: cultura
ocidental; a cultura dos esquimós.
E
para fazer um contraste com o termo acima citado, Caldas ( 2008, P.14) utiliza
o conceito do antropólogo Clifford Geertz, que segundo ele é mais complexo e
elaborado:
“[...]
a cultura é mais bem vista não como complexos padrões concretos de
comportamento – costumes, usos, tradições, feixes de hábitos- como tem sido o
caso até agora, mas como um conjunto de mecanismos de controle- planos,
receitas, regras, instruções (o que os engenheiros da computação chamam “programas”)
- para governar o comportamento”.
Assim sendo, nenhum
povo, atrasado ou desenvolvido, agirá da mesma forma, diz o autor. Ele
exemplifica esse fato através do monoteísmo, que pode até tornar-se semelhantes
as sociedades. Todavia, a maneira que esse deus será cultuado em cada cultura
será diferente. Em outros casos, um mesmo povo pode apresentar diversas
representações culturais, como é o caso da Índia. Do mesmo modo o Brasil
apresenta características populares diversas, de região para região, ainda que
todos se unam através de um mesmo idioma, língua portuguesa e pela fé católica
apostólica romana.
Caldas
( 2008, p. 16) também apresenta cultura como um meio de manutenção da
sociedade:
O
fato significativo, no entanto, é sabermos que jamais encontraremos duas
comunidades com culturas iguais. É preciso notar que a sociedade é formada por
um contingente organizado de pessoas, regidas pelo mesmo conjunto de normas e
leis, que de alguma forma aprenderam a viver e a trabalhar juntas para a
própria manutenção dessa sociedade. [...]
Agora, reflita sobre a
ação da catequese jesuítica. Ela é a imposição de uma outra cultura, avessa e
estranha aos costumes dos nativos. Ela não respeitou as circunstâncias as quais
os índios estavam acostumados. Sua geografia, seus hábitos, crenças e
comportamentos. Sim, pois sabe-se que uma cultura pode ser enriquecida pelo
simples contato com outra, como ocorre em trocas comerciais em níveis de
igualdade. Todavia, também o aniquilamento de uma cultura pode ocorrer através
da dominação e subjugação de uma civilização sobre a outra, como foi o caso dos
Dórios sobre os Espartanos.
Sobre
a catequese jesuítica na América Portuguesa, Romanelli ( 1999, p.21) diz:
No
colonialismo, iniciado na idade moderna, as trocas culturais se fizeram das
mais diversas formas. No que toca o novo mundo, elas foram aniquiladoras das
culturas indígenas [...] o que ocorreu foi uma transferência pura e simples dos
padrões culturais europeus para as terras das Américas [...]
Percebe-se, portanto, que os
europeus estavam em um nível de desigualdade em relação aos nativos americanos
no que se refere a recursos intelectuais. Por isso é considerada injusta sua
atuação sobre os indígenas. Sobre isso a autora afirma (1999, p.22) :
O
que ocorreu na ocasião da colonização das terras americanas foi um transplante
de recursos materiais e humanos de uma sociedade, cuja cultura já havia
atingido um alto nível de complexidade, para um meio que não oferecia condições
de troca em pé de igualdade. [...]
Desse modo pode-se
inferir de maneira análoga, o papel do educador. Ele deve avaliar o nível de
complexidade cultural de seus educandos, respeitando suas limitações. Quando se
trabalha com o fenômeno religioso, deve-se evitar o proselitismo e o conceito
de verdade absoluta. Assim, cada indivíduo poderá por conta própria chegar a suas
próprias conclusões. O que ocorreu com os padres Jesuítas, é que motivados pela
fé e pelos interesses econômicos da coroa, acabaram “desrespeitando“os limites
culturais dos índios a quem “educavam”. Lembre-se que nesse período vigorava as
ideias de que o europeu era o homem modelo, através humanismo e eurocentrismo.
Portanto, esses padres, como filhos de seu tempo, agiram de acordo com sua
época.
O que facilitou a
instalação do pensamento católico em terras coloniais? Segundo Romanelli (
1999, p.33) foi o modo de vida patriarcal:
Foi a família
patriarcal que favoreceu, pela natural receptividade, a importação de formas de
pensamento e idéias dominantes na cultura medieval européia, feita através da
obra dos jesuítas [...]
Sabe-se que muitos
portugueses vieram nas missões para povoar as novas terras “descobertas. “Os
colonos contribuíram e muito para o estabelecimento da cultura européia em
terras americanas. Claro que houve mesclas de culturas, miscigenação de povos e
de crenças, todavia o que prevaleceu sem sombra de dúvidas, foi a cultura
branca, cristã e européia. Romanelli diz (1999, P 34):
O ensino que os padres
jesuítas ministravam era completamente alheio à realidade da vida na colônia[...]
Ora,
já fora dito que de início os primeiros missionários eram bem tolerantes com
alguns dos comportamentos nativos. Porém, sua presença na colônia também servia
para monitorar e zelar pela moral dos colonos. Desse modo, tanto buscavam mudar
a cultura local, como preservar a de seus compatriotas. A melhor maneira de
perpetuar as idéias cristãs católicas seria através do ensino. Os padres
Jesuítas ofereciam educação elementar para índios e brancos, salvo as mulheres.
Educação média para classe dominante e superior apenas para os sacerdotes.
Logo, sobre o principal objetivo da ordem dos inacianos, Romanelli ( 1999, p.
34) diz:
Não
se pode perder de vista, evidentemente, os objetivos práticos da ação jesuítica
no novo mundo: o recrutamento de fiéis e servidores [...] A catequese assegurou
a conversão da população indígena e foi levada a cabo mediante a criação de
escolas elementares para os cumirins e de núcleos missionários no interior das
nações indígenas [...]
Assim, fica claro como
a educação pode moldar toda uma estrutura social, alterando até mesmo uma
cultura, dependendo de seu nível de complexidade. Tome por base os nativos americanos
que aqui viviam. Eles já estavam nessas terras há centenas de anos, viviam sob
o mesmo sol dos europeus, todavia com outros costumes, crenças e
comportamentos. Portugal chega a essas terras em 1500; a colonização perdura
até 1822, sendo que a catequese jesuítica atuou por cerca de duzentos e dez
anos. Isso fora suficiente para suplantar toda uma história que simplesmente
fora “apagada” e substituída por outra. Com certeza, os padres obtiveram êxito.
Segundo Ghiraldelli ( 2006, p. 25):
O plano de estudos do
Padre Manoel de Nóbrega continha o ensino do português, a doutrina cristã e a
escola de ler e escrever [...] .
Com
esses métodos, os missionários da companhia de Jesus conseguiram transformar
índios pagãos em “cristãos”. Ghiraldelli ( 2006, p.26) prossegue:
Os
colégios jesuítas tiveram grande influência sobre a sociedade e sobre a elite
brasileira. Não foram muitos, diante das necessidades da população. Todavia, foram
suficientes para gerar uma relação de respeito entre os que eram donos das terras
e os que eram donos das almas.Quando os jesuítas foram expulsos de Portugal, e
portanto, de suas colônias, em 1759, tínhamos em nosso país mais de cem
estabelecimentos de ensino. Considerando os colégios, as residências, as
missões, os seminários e as escolas de ler e escrever, sob administração direta
dos jesuítas.
Ainda sobre a análise
dos aspectos culturais de um povo, seus níveis de complexidade e sua interação
ou diálogo com outros povos, deve-se notar ou reforçar que, ou ambas as
culturas são enriquecidas, ou uma delas será prejudicada. Deve-se também
perceber, como no caso das missões jesuíticas, o discurso legitimador das
práticas de sujeição e dominação sobre outras culturas. Neste caso, a evangelização cristã, em prol
da alma pecadora, ignorante do Deus judaico-cristão, do paraíso, do inferno e
de tudo que diz respeito as coisas espirituais. Sobre essa premissa, os missionários
adentraram nas caravelas lusitanas afim de ganhar almas para o reino dos Céus, ainda
que os interesses do reino português também não fossem desconsiderados.
Portanto, a análise que agora se fará é sobre o nativo visto sob a ótica do europeu
cristão.
Analisar-se-á os
discursos acerca dos indígenas do novo mundo. Ora, eles são vistos como maus,
seres sem alma e portanto não são como os seus dominadores. Outra hora, são
vistos como bons, puros e exóticos, revelando o contraste com seus “algozes”.
Silvia Duschatzky e
Carlos Skliar, em “O nome dos outros. Narrando a alteridade na cultura e na
educação”, fazem uma observação interessante sobre o tratamento dado àqueles
que são diferentes dos demais grupos sociais. Neste caso o outro como estranho
é o nativo indígena, sob a ótica lusitana.
O nativo como fonte do mal. Pode-se dizer que
o simples fato de os missionários imporem seus costumes sobre os índios,
implique que consideravam seu estilo de vida como inadequado ou ruim. Segundo
os autores( 2001, p.121) :
[...] não é só na
eliminação física que se realiza o ato expulsor. Essa é sua face mais óbvia,
mas não a única [...] A própria civilização desloca a violência externa à
coação interna, mediante a regulação de leis, costumes e moralidades[...]
Foi exatamente o que a
catequese proporcionou aos índios que aqui residiam. Ela suplantou ao longo de
dois séculos todos os costumes, as crenças, o modo de ver o mundo e de produzir
para sobrevivência. O europeu trouxe consigo um novo código de ética, completamente
estranho àqueles homens “primitivos”. Uma nova moral foi ensinada aos cumirins,
gerando assim conflitos entre as gerações antigas e novas. Não somente isso,
mas o jesuíta, como emblema do homem branco europeu, letrado, religioso, põe-se
como centro da vida social em colônia, visto que não somente os índios agora
orbitam em sua volta, bem como os colonos portugueses, devem seguir à risca os
dogmas e tradições católicas, para o bem comum de todos, diziam os padres.
Sobre
colocar-se como centro nas relações sociais, os autores (2001, p.123) dizem:
[...]
o centro expulsa suas ansiedades, contradições e irracionalidades sobre o termo
subordinado, levando-o com as antíteses de sua própria identidade. O outro
simplesmente reflete e representa aquilo que é profundamente familiar ao
centro[...]
Como já fora dito
anteriormente, a catequese jesuítica teve como principal objetivo “igualar” as
culturas, abrandando o nativo, fazendo-o mão de obra. Apagar as diferenças,
abafar as discrepâncias e “nivelar” os homens. Se bem que com a prática, os
padres perceberam que seria mais proveitoso investir nos colonos da elite
burguesa.
Desse modo, através de
teatro, música e diversos meios educacionais, os missionários criavam um
estereótipo para fixar as identidades. Assim, o outro é inventado, descrito e
estabelecido. Portanto, conclui-se que o estereótipo é uma invenção discursiva
opressora. Ela é, por assim dizer, uma ferramenta de controle social.
Quando os estereótipos
são criados, e quando são taxados de bons e maus, certo e errado pela cultura
dominante, resta ao termo subordinado esvaziar-se de sua identidade. Duschatzky
e Skliar afirmam ( 2001, p.124):
A alteridade, para poder
fazer parte da diversidade cultural bem entendida e aceitável, deve despir-se,
des-racionalizar-se, des-sexualizar-se, despir-se de suas marcas de identidade,
deve em outras palavras, ser como os demais.
Desse
modo os contrastes são estabelecidos e a necessidade do outro também. É o que
os autores chamam de efeito binário. Segundo os autores acima (2001, p.124):
[...]
Necessitamos do outro, mesmo que assumindo certo risco, pois de outra forma não
teríamos como justificar o que somos, nossas leis e instituições, as regras, a
ética, a moral, a estética de nossos discursos e práticas. Necessitamos do
outro, para em síntese, poder nomear a barbárie, a heresia, a mendicidade etc.
e para não sermos nós mesmos os bárbaros, hereges e mendigos.
Entende-se que não é de
forma ingênua que nem os jesuítas, nem
qualquer outra instituição atue em relação ao outro, ainda que o faça com o
discurso salvacionista. A alteridade é enquadrada para reafirmar a
superioridade do discursante, nesse caso o padre jesuíta. Assim, o índio,
exótico, diferente do euroupeu, ‘confirma”
sua razão, por seus atos parecerem desvaneios. Sua selvageria “confirma” a
civilidade do branco. E assim por diante.
Não é em vão que a fala
dos padres acerca dos nativos é em sua maioria depreciativa. O diferente é o
depósito de todos os males, o portador das falhas sociais. Assim como o judeu
foi considerado pelos alemães a causa de sua corrosão, os nativos eram vistos
como seres que deveriam ser melhorados, moldados, transformados. Isso não
revela a inferioridade do índio, apenas demonstra a visão orgulhosa que o
branco tinha de si.
Percebe-se
então, através desse binarismo, a fabricação de discursos de normalidade por
parte dos missionários da companhia de Jesus, uma ação legitimadora para as
práticas de exploração. Por serem superiores e por estarem incumbidos de uma
missão divina, os padres não estavam errados por agirem de tal maneira,
pensavam eles. Para os mesmos autores citados (2001, P. 125):
A
América latina sabe desses binarismos. A conquista a partir da visão europeia
vem inaugurar antagonismos essenciais: de um lado a mão redentora dos
conquistadores que traz modernidade e progresso; do outro, a brutalidade dos índios.
Portanto, é de extrema
importância a análise dos discursos feitos acerca do outro. Nunca são
inocentes. Estão carregados de ideologias e interesses políticos. No texto “Marcos
para uma história do pensamento antropológico”, François Laplantine ( 1996) trabalha exatamente sobre a
elaboração destes discursos acerca dos habitantes do novo mundo.O autor analisa
as produções literárias feitas por Las Casas e Sepulvera, um dominicano e um
jurista, respectivamente, no século XVI.
Ambos trabalharão o
conceito paradoxo entre civilizado e selvagem. Para Las Casas, o nativo é
organizado e inteligente. Chega a dizer que os nativos superam os europeus em
alguns aspectos, no momento evolutivo em que viviam. Já Sepulvera dizia que a
razão e a força física se opunham. Assim sendo, os índios, detentores da força,
deveriam servir aos brancos, detentores da razão e do conhecimento.
De
acordo com Las Casas e sua defesa dos nativos americanos, Laplatine ( 1996, p.
38-39) escreve :
Aqueles
que pretendem que os índios são bárbaros, responderemos que essas pessoas tem
aldeias, vilas, cidades, reis, senhores e uma ordem política que, em alguns
reinos, é melhor que a nossa (...) esses povos igualavam ou até superavam
muitas nações e uma ordem política que, em alguns reinos, é melhor que a nossa.
(...) Igualavam-se aos gregos e romanos, e até em alguns de seus costumes, os
superavam. Eles superavam também a Inglaterra, a França, e algumas de nossas
regiões da Espanha. (...) Pois a maioria dessas nações do mundo, senão todas,
foram muito mais pervetidas, irracionais e depravadas, e deram mostra de muito
menos prudência e sagacidade em sua forma de se governarem e exercerem as
virtudes morais. Nós mesmos fomos piores, no tempo de nossos ancestrais e sobre
toda a extensão de nossa Espanha, pela barbárie de nosso modo de vida e pela
depravação de nossos costumes.
Já
o argumento do Jurista Sepulvera é o oposto deste anterior, na obra do mesmo
autor citado acima (1996, p.39):
Aqueles
que superam os outros em prudência e razão, mesmo que não sejam superiores em
força física, aqueles são, por natureza, os senhores; ao contrário, porém, os
preguiçosos, os espíritos lentos, mesmo que tendo as forças físicas para
cumprir todas as tarefas necessárias, são por natureza servos. E é justo e útil
que sejam servos, e vemos isso sancionado pela própria lei divina. Tais são as
nações bárbaras e desumanas, estranhas à vida civil e aos costumes pacíficos. E
será sempre justo e conforme o direito natural que essas pessoas estejam
submetidas ao império de príncipes e de nações mais cultas e humanas, de modo
que, graças à virtude destas e prudência de suas leis, eles abandonem a
barbárie e se conformem a uma vida mais humana e ao culto da virtude. E se eles
recusarem esse império, pode-se impô-lo pelo meio das armas e essa guerra será
justa, bem como declara o direito natural que os homens honrados, inteligentes,
virtuosos e humanos dominem aqueles que não tem essas virtudes.
O contraste entre esses
dois discursos é evidente. Sepulvera frisa bastante a questão da humanidade.
Para ele, os índios são quase considerados outra coisa que não homens. Havia um
debate se os índios possuíam almas e se a salvação de Cristo lhes dizia
respeito. Esse debate girou em torno de conceitos religiosos e de costumes
civilizados. Perceba a binarismo: bom - mau, selvagem- civilizado, bárbaro-
helenista, primitivo- desenvolvido, animal- homem.
Laplantine (1996, p.41) escreve sobre o conceito de mau
selvagem:
Assim,
não acreditando em Deus, não tendo alma, não tendo acesso à linguagem, sendo
assustadoramente feio e alimentando-se como um animal, o selvagem é apreendido
nos modos de um bestiário. E esse discurso sobre a alteridade, que recorre
constantemente a metáfora zoológica, abre o grande leque das ausências: sem
moral, sem religião, sem lei escrita, sem Estado, sem consciência, sem razão,
sem objetivo, sem arte, sem passado, sem futuro. Cornelius de Paw acrescentará
até, no século XVIII; “Sem barba, sem sobrancelhas, sem pelos, sem espírito,
sem ardor para com sua fêmea.
Todos
esses discursos que inferiorizavam o americano nativo tinham como principal
objetivo afirmar a superioridade do branco europeu. Este em sua grandeza ainda teve a “generosidade”
de propagar sua fé e fazer com que seres tão brutais e animalescos se tornassem
melhores, pensavam eles. Laplantine ( 1996, p. 41-42):
É
a grande glória e a honra de nossos reis
e dos espanhóis, escreve Gomara em sua História geral dos índios, ter feito
aceitar aos índios um único Deus, uma única fé e um único batismo e ter tirado
deles a idolatria, os sacrifícios humanos, o canibalismo, a sodomia, e ainda
outras grandes e maus pecados, que nosso bom Deus detesta e pune. Da mesma
forma, tiramos deles a poligamia, velho costume e prazer de todos esses homens
sensuais, mostrando-lhes o alfabeto sem o qual os homens são como animais e o
uso do ferro que é tão necessário ao homem. Também lhes mostramos vários bons
hábitos, artes, costumes policiados para poder melhor viver. Tudo isso- e até
cada uma dessas coisas- vale mais que as penas, as pérolas, o ouro que tomamos deles,
ainda mais porque não utilizavam esses metais como moeda.
O discurso europeu se
baseia na moralidade cristã ocidental da época. Para Gomara, os brancos estavam
fazendo um grande favor aos índios, ainda que os explorando, visto que ele
mesmo admite que seus costumes ensinados valiam muito mais que o ouro e as
pérolas preciosas que os mesmos tomaram dos nativos.
Gomara
é só um dentre muitos que tinham esse mesmo discurso pejorativo acerca dos
índios americanos. De Pauw, por exemplo, sobre os índios norte-americanos, diz
que estes são degenerados, e atribui isso a qualidade do clima. Citando
Laplantine (1996, p.43):
Eles
tem, prossegue Pauw, um “temperamento tão úmido quanto o ar e a terra onde
vegetam” e que explica que eles não tenham nenhum desejo sexual. Em suma, são
“infelizes que suportam todo o peso da vida agreste na escuridão das florestas,
parecem mais animais do que vegetais. [...]
Para
Pauw os nativos eram inúteis, irracionais e improdutivos. Essa literatura do
século dezoito é fruto de ideias de séculos anteriores e que influenciaram sem
sombra de dúvida a forma de pensar em períodos posteriores. Como é o caso de
Rousseau em o Discurso sobre a desigualdade, também no século XVIII e Hegel em
Introdução a Filosofia da História, no século XIX. Laplantine faz a citação
(1996, p.45):
Na
leitura dessa Introdução, a América do Sul parece mais estúpida ainda do que a
do Norte. A Ásia aparentemente não está muito melhor. Mais é a África, e em
especial a África profunda do interior, onde a civilização nessa época não
penetrou, que representa para o filósofo a forma mais nitidamente inferior
entre todas nessa infra-humanidade.
Hegel
considerava os índios estúpidos e achava que os negros eram os piores da raça
humana. Hegel os tinha como nada. Na obra de Laplantine se observa (1996,
p.45):
Tudo,
na África, é nitidamente visto sob o signo da falta absoluta:‘os negros” não
respeitam nada, nem mesmo eles próprios, já que comem carne humana e fazem
comércio da ‘carne’ de seus próximos. Vivendo em uma ferocidade bestial
inconsciente de si mesma, em uma selvageria em estado bruto, eles não tem
moral, nem instituições sociais, religião ou Estado. Petrificados em uma
desordem inexorável, nada, nem mesmo as forças da colonização, poderá nunca
preencher o fosso que os separa da história universal da humanidade.
É importante o
conhecimento dessa literatura para a compreensão da mentalidade da época e das
motivações que a mesma carregava. Do mesmo modo, Hegel acaba por legitimar
através de sua Filosofia a colonização desses povos por parte de seus
semelhantes, os brancos europeus, que segundo ele mesmo, em tudo eram
superiores ao resto do mundo. Explorar aquilo que Hegel dizia não poder ser comparado
nem mesmo a um vegetal, não teria problema algum.
No século XX o nativo passou a ser visto de maneira romântica. Isto é,
ele deixara de ser o mau selvagem para se tornar sua antítese, o bom selvagem.‘O
Selvagem não é quem pensamos”. Aqueles que outrora eram vistos como animais,
passam a serem vistos como doces habitantes de um paraíso perdido. É importante
a compreensão destes discursos em seus tempos históricos, pois assim entende-se
as motivações e legitimações dos missionários jesuítas no século XVI na América
Portuguesa. Suas ações estavam de acordo com a produção epistemológica de seu
tempo. Desse modo, somos fruto e filhos de nossa época. Portanto, analisar os
discursos produzidos sobre o outro, isto é, sobre a alteridade é de extrema
importância para o educador que lida diariamente que as mais diversas classes
de pessoas. Do mesmo modo, saber transmitir esses fatos aos educandos é de
extrema valia, visto que o preconceito com o diferente é uma produção humana.
Laplatine ( 1996, p.46) escreve sobre a
mudança de discurso acerca dos nativos:
A figura de uma natureza má na qual vegeta um
selvagem embrutecido é eminentemente suscetível de se transformar em seu oposto:
a da boa natureza dispensando suas benfeitorias à um selvagem feliz. Os termos
da atribuição permanecem, como veremos, rigorosamente idênticos, da mesma forma
que o par constituído pelo sujeito do discurso (o civilizado) e seu objeto (o
natural). Mas efetua-se dessa vez a inversão daquilo que era apreendido como um
vazio que se torna um cheio (ou plenitude), daquilo que era apreendido como um
menos que se torna mais. O caráter privativo dessas sociedades sem escrita, sem
tecnologia, sem economia, sem religião organizada, sem clero, sem sacerdotes,
sem polícia, sem leis, sem Estado- acrescentar-se-á no século XX sem complexo
de Édipo- não constitui uma desvantagem. O selvagem não é quem pensamos.
Apela-se agora para a ingenuidade do índio, porém a representação de sua
figura ainda é a de exótica. Assim, desde depois do Renascimento, o nativo é um
ser exótico, que anda nu, que vive livre de normas e leis. De uma forma
romântica Cristovão Colombo registrou ( 1996,
P. 47):
Eles são muito mansos, e ignorantes do que é mau, eles não sabem se
matar uns aos outros (...) Eu não penso que haja no mundo homens melhores, como
também não há terra melhor.
Esse discurso fora usados posteriormente para enfatizar a maldade do
europeu, o mau civilizado. No século XVI a temática da crueldade fora abordada
para se referir aos naturais. Todavia, tanto Léry como Montaigne vão
representar os europeus como sendo ainda mais selvagens que os nativos. Afinal,
eles rompem com aquela paz paradisíaca dos índios, além do que roubaram todas
as suas riquezas. O sistema de colonialismo é de exploração. Foi nesse contexto
que os missionários jesuítas estavam inseridos. E como se viu ao longo de todo
este trabalho, eles foram de extrema importância para o sucesso do
empreendimento português.
Mesmo nos séculos XVII e XVIII, vê-se a
constatação dos próprios Jesuítas sobre os índios. Diz o autor ( 1996, P. 48).
Eles são afáveis, liberais, moderados. Todos
os nossos padres que frequentavam os selvagens consideraram que a vida se passa
mais docemente entre eles do que entre nós. Seu ideal:“viver em comum sem
processo, contentar-se de pouco sem avareza, ser assíduo no trabalho.
Percebe-se uma mudança gigantesca nos
discursos sobre os nativos, ou é dada uma ênfase, antes não dada, a textos que
romantizavam os índios. Talvez motivada por uma desilusão com o dito moderno,
civilizado, que agora procurava na simplicidade da vida primitiva, um sentido
para a vida. O mesmo autor citado acima (1996, P 50):
[...] A decepção ligada aos “benefícios do
progresso (nos quais muitos entre nós acreditam cada vez menos) bem como a
solidão e o anonimato do nosso ambiente de vida, fazem com que parte de nossos
sonhos só se aspirem a se projetar nesse paraíso perdido dos trópicos ou dos
mares do sul, que o ocidente teria substituído pelo inferno da sociedade
tecnológica.
Perceba que sempre a história ou os discursos históricos são feitos pelo
europeu. Outrora, em pleno renascer da
cultura latina, ele era o modelo clássico de ser humano, o padrão por
excelência. Isto lhe dava o direito de explorar o mundo, impor suas regras e
sua cultura “superior”. Com o passar do tempo, este mesmo europeu, ou uma parte deles, escreve cheio de desilusão
acerca de si mesmo. Olha para aquele que achava estranho, exótico e diferente,
que em seus pensamentos preconceituosos, não possuíam nem mesmo uma alma, agora
se tornaram exemplos a serem seguidos.
Os tempos mudam os discursos e abalam as verdades outrora produzidas
pelos pensadores. Resumidamente Laplatine
( 1996, p. 51) descreve:
A imagem que o ocidental se fez da alteridade (e correlativamente de si
mesmo) não parou, portanto, de oscilar entre os pólos de um verdadeiro
movimento pendular.
Ora, o nativo era um monstro, um animal com
figura humana. Ora os ocidentais eram esse monstro e tinham muito o que
aprender com estes nativos; Ora os índios eram descritos como infelizes e
miseráveis, ou eram representados como quem vive em harmonia e plenitude com a
natureza, diferente do ocidental que vivia sob a duras tarefas da indústria.
Ora o índio era descrito como trabalhador, ora como preguiçoso.Ou não tinha
alma nem deus ou era extremamente religioso. Era bonito ou feio. O que se pode
extrair desses discursos é o que Laplantine ( 1996, p. 52) diz:
Tais são as diferentes construções (nas quais
a repulsão se transforma rapidamente em fascínio) dessa alteridade fantasmática
que não tem muita relação com a realidade. O outro- o índio, o taitiano, mas
recentemente o basco ou o bretão – é simplesmente utilizado como suporte
imaginário cujo lugar de referência nunca é a América. Taiti, o pais Basco ou a
Bretanha. São objetos-pretextos que podem ser mobilizados tanto com vistas à
exploração econômica, quanto ao militarismo político, à conversão religiosa ou
à emoção estética. Mas em todos os casos, o outro não é considerado para si
mesmo. Mal se olha para ele. Olha-se para si mesmo nele.
Assim
a História, sempre repetitiva, mostra que o outro, o diferente, é enquadrado, taxado,
rotulado por uma maioria, não sem intenções bem definidas. A cultura européias e
sobrepôs sobre as demais naquilo que disse sobre os outros e que indiretamente
acabou dizendo de si mesma.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Portanto, observou-se
neste trabalho que a vinda dos padres jesuítas fora de extrema importância para
a consolidação dos interesses reais da coroa lusitana. Sem os missionários de
Jesus, principalmente estes, Portugal não teria sido bem sucedido em seu
empreendimento político-econômico, isto é, na colonização dos nativos
sul-americanos, especificamente daqueles que formariam o Brasil.
Buscou-se analisar o
contexto não só do surgimento da companhia de Jesus, mas do cenário cultural-
intelectual ao qual estes estavam inseridos, de modo que pudesse se compreender
suas crenças e ensinamentos. Como fora relatado, o eurocentrismo permeava toda
a vida europeia, e os jesuítas não estavam isentos da mesma. Chegaram em Terras
brasílicas não só com o intuito de evangelização, mas antes disso, vieram como
agentes ideológicos de sua cultura, e principalmente, como agentes do rei de
Portugal. O discurso salvacionista servira bem para legitimar a exploração e os
abusos ocorridos na América portuguesa.
O objetivo principal
deste trabalho fora refletir sobre os métodos pedagógicos utilizados pelos
missionários Inacianos, para fazer um paralelo com a atuação do educador em
sala de aula. A educação religiosa, neste caso, fora a disciplina escolhida
como objeto de estudo, todavia, o conteúdo dessa dissertação aplica-se, sem
dúvida, à qualquer disciplina lecionada, visto que são os métodos empregados e
não somente o conteúdo ensinado que caracterizarão o abuso do poder pelos
pedagogos. Sabe-se, entretanto, que no caso dos indígenas, a suplantação de sua
cultura original deveu-se sobretudo, também, porque os missionários trabalharam
questões extremamente práticas do cotidiano, envolvendo moral e “bons
costumes”. Todavia, não descarta-se aqui o poder da ciência e do pensamento
filosófico de modelar culturas e forjar novos comportamentos na sociedade. Não
é apenas a disciplina religiosa que lida com temas que interferem diretamente
no seio popular.
Para a compreensão
geral da temática, fez-se necessário analisar:
1-
o contexto histórico dos séculos XVI- XVIII para compreender a ação jesuítica
na América Portuguesa;
2-a
educação religiosa feita pelos missionários da Companhia de Jesus na colônia
portuguesa;
3-
o conceito de cultura e refletir sobre o poder aculturador no ensino. Bem como
as práticas discursivas e a legitimação das ações pedagógicas.
Este trabalhou utilizou
o método bibliográfico para a formulação de suas ideias. O pensamento de
diversos estudiosos possibilitou o desenvolvimento desta obra. Espera-se que os
interessados no assunto não fiquem somente com esta resumida contribuição
acadêmica, mas que antes disso, busquem aprofundar-se, lendo os originais,
outros artigos relacionados e que possam do mesmo modo através de suas próprias
pesquisas, escreverem sobre o tema.
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Historiador e especialista em ciência das religiões.
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