sexta-feira, 14 de junho de 2013

O EXERCÍCIO DO PODER PELOS MARGINALIZADOS DA HISTÓRIA





Michelle Perrot em sua obra “Os excluídos da História” disserta sobre a vida dos marginalizados de um período histórico. Baseado em alguns de seus textos será abordado neste capítulo o exercício do poder por operários e  mulheres.
O Poder disciplinar dentro das fábricas europeias do século XIX, por exemplo, acabou por promover as greves operárias. A greve, então, deve ser vista como uma forma ou mecanismo utilizado pelas massas para reivindicar melhores condições de trabalho e de vida.
É sobre este poder disciplinar que o leitor deve focar o olhar para entender como ao longo dos anos ele transformou a sociedade contemporânea . Ele moldou camponeses, artesãos e andarilhos em operários, dando a estes uma capacidade produtora e lucrativa. O corpo" tornou-se" uma máquina por assim dizer.
Segundo Perrot (2001, p.53) :


[...]A disciplina industrial, aliás, não é senão uma entre outras, e a fábrica juntamente com a escola, o exército e a prisão etc., pertence a uma constelação de instituições que, cada qual a sua maneira, participa da elaboração dessas regulamentações[...]


Não que as grandes fábricas fossem prisões, mas seus mecanismos disciplinares em muito se assemelhavam com os daquela. Pois apropriando-se da criação de Jeremy Bentham, “o Panopticon”, as grandes indústrias europeias conseguiram através da vigilância promover a ordem entre seus operários. As fábricas eram espacialmente projetadas com a finalidade de haver visibilidade e controle das ações dos trabalhadores. Como também permitiram uma divisão do trabalho mais intensa e produtiva. O objetivo maior dos burgueses era evitar furtos de matéria prima e obter uma qualidade maior no acabamento de seus produtos. Para tanto fora necessária a formulação de todo um mecanismo organizacional. Começando pela ostentação do poder capital através dos grandes prédios fabris, passando pela facilitação de transporte de materiais, como pelo controle da movimentação interna e externa nas indústrias.  A especialização do serviço cooperou para o maior controle da produção. Por exemplo, a função do porteiro e do examinador , ambos eram responsáveis pela vigilância, seja das entradas e saídas, seja pela vistoria da mercadoria. Mas o que falar dos senhores capitalistas?
O Patrão se apresentava a seus funcionários como um pai, que os amava, mas que muitas vezes deveria aplicar penas a fim de corrigir seus erros. Isso gerava um sentimento de pertencimento nos operários. Este mesmo mecanismo fora utilizado por governantes autoritários, como por exemplo na política fascista do século XX.   Percebe-se estas características mais notadamente na indústria têxtil , principal chave da primeira revolução industrial.  Entretanto, não deve-se achar que tais patrões fossem amados e estimados por  seus subalternos. Muitas vezes foram retratados com desprezo e depreciados com palavras ofensivas.
Outro mecanismo adotado pelos industriais era empregar famílias inteiras, garantindo a fidelidade da mesma. Posteriormente surgirá os primeiros administradores que substituirão a figura paterna e imporá todo um código de ética,  inspirado no exército, dentro da empresa. O silêncio dava ao ambiente um ar de "sagrado" e lembrava a todos que a ordem e decência que os homens tinham dentro das igrejas, deveriam ter dentro do espaço de trabalho. De acordo com Perrot (2001, p.68):


Os regulamentos preveem todo um elenco de sanções: essencialmente multas em caso de faltas, atrasos, falhas de fabricação, mas também por deterioração das máquinas, brigas dentro ou na frente da fábrica, cachimbos mal apagados, bagunças, disputas, grosserias, conversas obscenas, maneiras indecentes, embriaguez, falatórios, deslocamentos fora do serviço, insolência em relação aos chefes[...] 


Com o passar do tempo estas ações disciplinares tornaram-se mais do que abusivas, tornaram-se insustentáveis. E como já foi dito, a greve era a melhor maneira de os operários demonstrarem sua insatisfação. É a partir destas crises que surgem os sindicatos trabalhistas e delegados de fábrica.
Tantas foram as vezes que os trabalhadores levantaram-se contra a modernização das fábricas. Temiam ser substituídos pelas máquinas, bem como perder o lugar que lhes pertencia a gerações. Por isso mesmo não foram poucas as vezes que os mesmos quebraram aquelas que se tornariam um símbolo do poder burguês. Negavam-se a dividir o mesmo espaço com estas que ameaçavam seu sustento, principalmente com as grandes máquinas.
Não se pode aqui cometer o erro de excluir as mulheres da história das reivindicações. Aliás, por muito tempo elas foram silenciadas ou porque não dizer, excluídas da História Geral. Sempre vista como improdutiva, a mulher fora formada pelo homem através de um discurso machista.  No século XIX , principalmente na França, ela , a mulher, deveria estar reclusa em sua casa, ser uma boa mãe e cuidar bem de seu esposo, que todos os dias ia buscar o sustento do lar nas fábricas e indústrias modernas.
A sociedade contemporânea é herdeira do discurso misógino em que a mulher é representada muitas vezes pelo fogo, por ser ela destrutiva,inflamadora das paixões mais carnais. Ou pela água, sendo passiva, parada, amorosa e submissa. Ou pela terra, fecunda e penetrável. O que se pode dizer de fato é que a mulher foi e continua sendo vítima da história feita pelos dominantes. Entretanto, vê-se também no século XIX uma mulher francesa que luta, que reivindica, que reclama e , logo, exerce poder.  Ela, gestora da vida cotidiana, fazedora de trabalhos domésticos, mas portadora de uma voz e de uma vontade de mudança. Conseguiu o direito de administrar os salários de seus maridos.
Assim diz Perrot (2001,p.191-192):


A administração do salário é, sem dúvida, uma difícil conquista das mulheres, resultado de uma luta cheia de ciladas, onde o patronato, cioso em favorecer o “bom” uso do salário, por vezes estendeu às mulheres uma mão generosamente compassiva [...]


“Elas, descontentes com os preços dos produtos essenciais para a alimentação de seus filhos, saiam às ruas para protestar, e isso através de motins” .(PERROT, 2001 )
As mulheres também participaram do movimento de quebra máquinas ocorrido na Europa que ficou conhecido como Luddismo. Elas se opunham a modernidade inglesa, queriam continuar trabalhando em suas casas e não em manufaturas. E sua forma de dizer não a algo era tão intensa que muitas conseguiram o que queriam, ainda que por um período de tempo. Os sindicatos também escandalizavam-se com as posturas femininas, chamavam-nas de selvagens, irresponsáveis e inadequadas.
Para Perrot,:[...] Mais vale deixar as mulheres isoladas e dar-lhes trabalho para fazer em casa do que reuni-las aos montes, pois as pessoas dessa categoria são como plantas que fermentam quando amontoadas. (PERROT,2001 p. 198)
As máquinas não eram, portanto, apenas inimigas dos homens, isto é, dos maridos, mas também das mulheres, as esposas, que souberam exercer seu poder em forma de protesto, de luddismo, de marchas e manifestos .
Mas a quê se deve esse espírito tão combativo do Europeu? Sem sombra de dúvida advém da Revolução Francesa. Não somente isso, mas como diria Hobsbown, “ A ideologia e a política do século XIX deve muito a Revolução Francesa”. “Se a economia do mundo do século XIX foi formada principalmente sob a influência da revolução industrial britânica, sua política e ideologia foram formadas fundamentalmente pela Revolução Francesa” (HOBSBOWN, 1996)
O autor Inglês a exalta acima de todas as outras revoluções. Diz que foi ela quem praticamente criou os termos “nação e patriotismo” no sentido moderno (ROBSBOWN, p. 87). Por isso podemos afirmar que aqueles marginalizados a quem Perrot se reporta como agentes ativos do poder no ato de reivindicação são “frutos” ou reflexo de uma gente que “ nasceu” protestando e exigindo seus direitos.
A própria história da Revolução Francesa diz isso. Nascida sob uma grande crise econômica, ela percorreu caminhos inéditos e atingiu proporções nunca vistas. Toma-se, portanto, esta Revolução como emblema de tudo aquilo que falou-se desde o primeiro capítulo desta obra. Sim, pois a Revolução Francesa é a grande divisora de águas desta sociedade Moderna e é digna de ser analisada na perspectiva do exercício do Poder.
Por que a Revolução Francesa para analisar o Poder? Primeiro, porque no primeiro capítulo analisou-se o Poder centralizado nas mãos do Príncipe de acordo coma obra de Maquiavel.  Na França houve monarquia Absolutista, logo houve poder centralizador.  Segundo, na Revolução Francesa as massas populares se moveram de tal modo que conseguiram derrubar o Antigo Regime, isto é, o poder real e toda sua estrutura política. E isso é a prova do que Foucault diz em sua obra “A micro física do Poder”, que o poder é exercido por todos, inclusive pelas massas.
A intenção deste terceiro capítulo é fazer um diálogo entre aquilo que Maquiavel disse ao Príncipe, ou seja, os cuidados que deveria tomar para preservar seu poder, com aquilo que Foucault diz em sua obra já citada, que o poder não é uma coisa que se possui, mas que se exerce , tendo por base a Revolução Francesa.  Segundo Foucault (2006, p.75):


[...] Sabe-se muito bem que não são os governantes que o detêm [...] Onde há poder, ele se exerce. Ninguém é propriamente falando, seu titular, e, no entanto, ele sempre se exerce em determinada direção, com uns de um lado e outros do outro, não se sabe ao certo quem o detém, mas se sabe quem não o possui [...]


Nesta Revolução encontra-se a figura do Rei, símbolo do poder máximo em outros tempos históricos, que possuía também a capacidade de enobrecer àqueles que naturalmente não eram nobres.  Segundo Grespan (2008, p.76):


Além disso, se ainda mais do que antes o monarca representa a figura do primeiro “gentil homem” do reino, por outro lado ele permanece com a prerrogativa única do enobrecimento. Ele mantém daí a prática de conceder títulos a burgueses ricos e aos funcionários da nobreza de toga, o que irritava os aristocratas antigos e os levava a tentar defender-se da excessiva ampliação do seu status especial. [...]


A figura do rei na História dos Homens sempre foi de grande relevância. Outrora ele era tido como o “escolhido de Deus” para trazer justiça a Terra, ou era visto como a própria encarnação de Deus. Todos o reverenciavam com grande respeito e o temiam mais que tudo, afinal, o rei era a própria Lei. Entretanto, na França, graças a algumas medidas tomadas por Luís XVI, que convocou a Assembléia dos Notáveis a fim de convencer a nobreza e o clero a também pagarem impostos, o que antes não faziam para preservarem seu Status, fez com que a Figura Real se tornasse a de um Tirano, ou ainda melhor, de um Déspota.
O Povo, usado como “massa de manobra” pelos insatisfeitos aristocratas, acaba protestando contra o rei e em favor da nobreza. Entretanto, o que estes não sabiam é que aquilo seria apenas um passo de uma longa caminhada que acabaria por se tornar a causa de uma Grande Revolução. De acordo com Grespan (2008, p.79):


Quando o monarca se impõe e decreta as reformas, passando por cima da Assembléia dos Notáveis, ocorrem até agitações populares em Paris e nas províncias, favoráveis à causa da nobreza. O Parlamento e a importância da participação da aristocracia na vida política do reino, defendidos por Montesquieu, servem aqui de instrumentos poderosos para configurar a reivindicação aristocrática como luta da nação inteira contra o despotismo [...]


Vale ressaltar que toda esta luta se deu baseada no pensamento filosófico iluminista. É aquilo que Michel Foucault diz sobre a função dos intelectuais na sociedade e sobre a legitimação das ações. O Saber é uma ferramenta indispensável para o exercício do poder, ele“desperta” e produz movimento. Neste caso utilizado pelas classes favorecidas para manutenção de seus direitos.
Mais uma vez o povo é incluído nas discussões, visto que nem mesmo a Assembléia dos Notáveis, isto é, da nobreza, deu conta de resolver o impasse com o Rei. Então, apelou-se para a Assembléia dos Estados Gerais. Até aqui o povo explorado e escravizado é lembrado apenas para proveito das minorias. Entretanto, a História que os “Grandes” escreviam estava prestes a tomar um caminho inesperado. Segundo Grespan (2008, p.80):


[...] A Coroa esperava dela apenas uma solução técnica para o problema fiscal, enquanto a nobreza queria um respaldo no seu embate contra o rei. Havia, porém, em relação à Assembléia dos Notáveis, uma diferença crucial: nos Estados Gerais tomava assento também o “terceiro estado”, ou seja, a ordem dos que não eram nobres nem clérigos. Por qual lado se inclinaria essa ordem?


A participação popular mudaria todo o percurso que aquelas discussões tinham tomado. Maquiavel estava certo, o “favor” do povo era indispensável para a manutenção do poder do Príncipe. Para Maquiavel (2008,p.67):


[...] Quando o povo é inimigo, um Príncipe jamais estará garantido, por serem muitos os que compõem o povo [...] Concluirei, apenas que a um príncipe é necessário ter o povo como amigo, caso contrário não terá salvação nas adversidades.


O Povo tinha naquele momento a chance de gritar em alta voz através de seus representantes eleitos para a Assembléia dos Estados Gerais aquilo que os inquietava. O antigo amor pelo rei foi transformado pelas injustiças cotidianas e pelos discursos dos nobres em descrédito. Logo, ao lado do Rei o povo não deveria estar. Mas não se colocaria ao lado daqueles que por anos os exploraram, isto é, os aristocratas. O povo já estava influenciado pelas idéias luministas e queriam exercer seus direitos naturais. Exigia mudanças profundas na sociedade, como por exemplo o abrandamento dos tributos e até mesmo seu fim. “De qualquer modo, uma coisa começava a ficar clara: “o terceiro estado tinha seus interesses e projetos próprios.” (GRESPAN, 2008, p. 80).
Cada estado na Assembléia tinha o direito a trezentos votos .  Isto sempre deixava o terceiro estado em desvantagem, visto que a nobreza e o clero compartilhavam dos mesmos interesses, unindo-se, derrotavam a minoria. Por isso que o Terceiro Estado ganhou o direito a mais trezentos representantes e a votação foi por cabeça. Ficando , portanto, o primeiro e o segundo estado com trezentos deputados cada e o terceiro com seiscentos. Uma coisa ambas tinham em comum : desejavam ardentemente limitar o poder do rei. 
Conforme diz Grespan( 2008,p.82):


Depois de algumas semanas de embates acalorados inteiramente dedicados a essa questão, vence a maioria, e a partir de 24 de junho as três ordens se unem numa só assembléia, que logo depois se declara “ constituinte”. Tratava-se realmente de discutir profundamente a estrutura social e política da França, dotando-a de uma Constituição que limitasse o poder absolutista do monarca.


A Revolução Francesa é por esse e por tantos outros exemplos um lembrete de que o povo deve ser temido. Os idéias iluministas penetraram tão profundamente na cabeça daquela gente, que a principio serviria apenas como massa de manobra, e tornou-a capaz de reivindicar seu lugar na França. Deu-lhes tamanha coragem que a coroa real caiu juntamente com a cabeça guilhotinada do rei.
O poder ali se manifestou em forma de luta, de guerra propriamente dita. Visto que assim como disse Maquiavel, nem o povo deseja ser oprimido, nem os poderosos desejam perder seu poder. Segundo Maquiavel (2008, p.65-66)


Porque em toda cidade se encontram essas duas tendências diversas e isso decorre do fato de que o povo não quer ser mandado nem oprimido pelos poderosos e os poderosos desejam governar e oprimir o povo. E desses dois anseios diversos surgem nas cidades um dos três efeitos: principado ou liberdade ou desordem. O principado é constituído pelo povo ou pelos grandes, conforme uma ou outra dessas partes tenha oportunidade, porque os grandes, vendo que não podem resistir ao povo, começam a emprestar prestígio a um dentre eles e o fazem príncipe para poderem, sob sua sombra, dar vazão a seu apetite, o povo também, vendo que não pode resistir aos poderosos volta sua estima a um cidadão o faz príncipe para ser defendido com sua autoridade


Para Grespan, os Marginalizados da História já não suportavam tamanho jugo sobre seus pescoços. Os Camponeses, as mulheres, os esquecidos do grande público aproveitaram o momento de insatisfação da nobreza com o rei e uniram-se na luta contra a tirania. É bem verdade que sem a iniciativa dos nobres , talvez nada tivesse  acontecido. Sem a fundamentação teórica dos filósofos iluministas e sem o exemplo da Independência Americana, provavelmente não haveria o que hoje se conhece como Revolução Francesa. Como o próprio Grespan diz (2008,p.83):


Mas a Revolução se determinava nessa esfera da Assembléia Constituinte, não menos importante era a mobilização popular, que constituía a esfera da ação revolucionária direta. Desde alguns anos explodiam insurreições camponesas em várias regiões da França. Também as classes baixas urbanas – chamadas “ Sans-culotte”- se revoltaram em inúmeras cidades  , com especial gravidade em Paris. Esses grupos sociais tinham grande expectativa de que os Estados Gerais e depois a Assembléia Constituinte conseguissem realizar reformas efetivas para melhorar sua condição de vida, e estavam dispostos a lutar para apoiar as decisões destas instituições contra os setores conservadores do antigo regime


Em outras palavras, a participação popular foi decisiva para a queda do antigo regime. Ainda que a principio o povo estivesse sendo manipulado pela nobreza, pode-se dizer que houve um verdadeiro despertar por parte das gentes, que culminou com sua “grande vitória.”
A Revolução Francesa é por isso mesmo exaltada pelo Marxista Eric Hobsbown que põe o povo como soberano. Segundo Hobsbown (1996, p.77-78):


Entretanto, oficialmente esse regime expressaria não apenas seus interesses de classe, mas a vontade geral do “povo”, que era por sua vez ( uma significativa identificação) “ a nação francesa”. O rei não era mais Luís, pela Graça de Deus, Rei da França e Navarra, mas Luís, pela Graça de Deus e do Direito Constitucional do Estado, Rei dos franceses. “ A fonte de todo a soberania”, dizia a Declaração, “reside essencialmente na nação” E a nação, conforme disse o Abade Sieyès, não reconhecia na terra qualquer direito acima do seu próprio e não aceitava qualquer lei ou autoridade que não a sua- nem a da humanidade como um todo, nem a de outras nações. Sem dúvida, a nação francesa com suas subsequentes imitadoras , não concebeu inicialmente que seus interesses pudessem se chocar com os de outros povos, mas, pelo contrário, via a si mesma como inauguradora ou participante de um movimento de libertação geral dos povos contra a tirania . [...]


                    Hobsbown só poderia mesmo exaltar a Revolução Francesa, pois ela é a iniciadora do combate das minorias militantes que segundo ele mesmo  estas seriam,” as forças poderosas, os trabalhadores pobres das cidades [...] o campesinato revolucionário.” (ROBSBOWN, 1996, )
Antes de ser Guilhotinado, o rei já havia perdido todo o seu prestígio, era por assim dizer, um estranho em meio a todo aquele movimento revolucionário. O rei e sua existência era o maior incômodo dos mais revoltosos. Sua figura aludia a tirania e ao despotismo, por isso deveria ser exterminada. Aliás, o que torna esta revolta popular tão particular é que o povo luta enraivecida mente não só contra o poder opressor, mas contra os símbolos deste poder.
A queda da Bastilha, por exemplo , representa esse ódio que as massas sentem do poder absolutista. Segundo Grespan (2008,p.83-84) :


Foi em tal contexto que aconteceu a queda da Bastilha, em 14 de Julho de 1789, evento considerado o marco inaugural da própria Revolução. Embora a Bastilha, velha fortaleza que perdera sua função militar, não fosse mais importante sequer como prisão, ela ainda tinha um valor simbólico como baluarte do absolutismo. Sua tomada pelo povo enfurecido teve imenso impacto e influenciou movimentos semelhantes também nas províncias, onde prefeitos e câmaras municipais foram alvo de ataque nas semanas seguintes, sendo substituídos por pessoas de confiança do terceiro estado. [...]


Quando as massas tiveram a oportunidade de expor sua raiva por todo o sofrimento que suportaram, o resultado foi um terror nunca antes visto. De fato, o escritor florentino, pai da política moderna, estava dando excelentes conselhos ao Príncipe. Parafraseando: “ É melhor ter o povo como amigo do que como inimigo” (Maquiavel,  2008 , p.67)
O que dizer então acerca do que Foucault disse sobre as prisões? A Bastilha foi aos olhos daquela gente o símbolo maior do poder tirânico do rei. Logo, tornou-se o primeiro alvo da ira popular: De acordo com Foucault (2006,p.73):


O que é fascinante nas prisões é que nelas o poder não se esconde, não se mascara cinicamente, se mostra como tirania levada aos mais ínfimos detalhes, e ao mesmo tempo, é puro, é inteiramente "justificado", visto que pode inteiramente se formular no interior de uma moral que serve de adorno a seu exercício: sua tirania brutal aparece então como dominação serena do bem sobre o mal, da ordem sobre a desordem.


A Bastilha ,como diz Grespan,  foi o primeiro de muitos outros símbolos do poder  real a ser  atacado. O próprio Palácio de Versalhes, símbolo do luxo e da riqueza da Coroa francesa, é atacado no dia cinco de outubro de 1789 por mulheres do povo que reclamavam pela falta de pão. As pessoas estavam insatisfeitas com as poucas mudanças ocorridas na estrutura social, ainda que suas ações estivessem carregadas de violência. As massas queriam mesmo profundas modificações em seu seio e não apenas restauração dos direitos naturais. O que acaba culminando em outro ataque feroz . Assim narra Grespan( 2008,p .90):


Quando as desconfianças aumentaram, conjugando-se á decepção com o governo dos moderados, a população de Paris explodiu de ódio ao rei e á nobreza : no dia dez de Agosto de 1792, ela ataca e toma o Palácio Real de Tulheiras, destituindo e aprisionando Luís XVI. É o fim da Monarquia e a instituição da República.


E por fim, para demonstrar a soberania popular, o Rei é Guilhotinado em 21 de Janeiro de 1793. Como já foi dito, sua existência representava o poder absoluto que não cabia mais naquele contexto revolucionário. As massas não aceitavam ninguém que enfraquecesse sua ação. Até mesmo aqueles que lutaram no início por sua ascensão e que acabaram tomando o poder para si, como é o caso de Robespierre, foram guilhotinados e excluídos de suas funções.
Pode-se dizer que o poder que estava nas mãos do Rei francês ameaçou a nobreza e o clero, que por sua vez, apropriou-se do povo para reivindicar seus direitos e diminuir os poderes absolutistas. Todavia, inspirados pelos ideais iluministas e movidos por seu contexto histórico, o povo através da força lutou contra seus opressores, destruindo seus principais símbolos .
Na verdade, o que os Marginais da História buscavam era seu lugar numa sociedade que deveria ser igualitária. Não se conformavam com as antigas estruturas, antes desejavam grandemente modificações mais radicais. Exterminaram todos aqueles que de algum modo se opunham a esse projeto, ou seja, os mais conservadores. E aprenderam através da luta e do combate que o poder não pertence a homem algum, ou a uma instituição, mas percorre todos os lugares, atravessa todas as estruturas e instâncias.
A Revolução francesa pode ser a resposta do porque o europeu possui um espírito tão combativo e protestante. De sair até hoje as ruas para reivindicar e lutar por melhores condições de vida. Ainda que for preciso se opor ao poder e seus símbolos, sejam máquinas, fábricas, prisões ou Palácios.
Para entender o Poder é necessário que se veja ele sob diversos ângulos. Uns o vêem como algo que o homem pode possuir; Outros defendem que ele está em todos os lugares. Alguns argumentam que a tirania é a representação maior do Poder; Outros dizem que a sujeição dos corpos, isto é, a disciplinalização dos mesmos , é a forma mais eficiente do poder.
Nesta obra usou-se autores como Eric Hobsbown, Michelle Perrot, Nicolau Maquiavel, Michel Foucault e outros que de forma direta ou indireta abordaram a temática do poder que instigou e continua instigando homens e mulheres do mundo inteiro, pois afinal de contas, todos estão de alguma maneira submetidos  ou exercendo  alguma espécie de poder.
A Revolução Francesa serviu , por assim dizer, como um emblema do diálogo proposto neste trabalho. O Príncipe de Maquiavel e a Microfísica do Poder são apenas o alicerce para um debate muito mais aprofundado e que requer bastante cuidado. Todavia, servem como obras introdutórias, que apresentam de maneira clara e direta o fascínio que o poder exerce sobre os Homens.

 Frankcimarks Oliveira
Historiador pelas Faculdades Integradas de Patos

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