Seguido de uma menção honrosa ao
pensamento filosófico-científico “Penso,
logo Existo”, Descartes vai propor a um mundo recém saído da era medieval o
contexto do mundo moderno, a concepção revolucionária de responder a
subjetividade não usando de artifícios espirituais complementados pela
escolástica (que reinava todas as discussões intelectuais da filosofia
medieval, principalmente na França), ou voltado aos pensamentos de uma pequena
elite letrada. O novo pensamento reacionário se voltaria ao livre pensar,
concepção de tentarmos responder a questões tão triviais e subjetivas ao nosso
próprio ver, numa atmosfera de ascendente saber científico.
Numa breve introdução o leitor deve estar se
perguntando o porquê de uma sociedade mecanicista e não mecanizada, ou outrora
mecânica. Essa abordagem é um fator de mera relevância sistemática, não sendo
um total isolamento do termo “mecânico”,
pois o próprio termo “mecanicismo” é
derivado dos seus mais diversos vocábulos, sendo os seus singulares
significados fontes de uma mesma concordância, o pensamento mecanicista creio
que linguisticamente têm uma maior compatibilidade ao estudo do intelecto sendo
esta a nomeação mais privilegiada e cabível ao argumento de uma tese que
simbolize os estudos da mentalidade de uma sociedade.
Portanto, estabelecer relações de
mecanicidade entre o homem e a sociedade é a discussão essencial dessa tese, o
homem enquanto “ser individual” representa para Descartes uma dádiva mecânica
perfeita “rés extensa” (extensão da
matéria), que é autônoma em relação aos valores espirituais ou a emoção da
mente, no que para Descartes representa a “coisa pensante” ou no original “rés cogitans”. Uma ruptura de valores
compõe o homem cartesiano, porem a discussão argumentativa se encaixa a partir
do lugar do homem na sua sociedade, nos aspectos mais divididos e analisados
para cada homem compor determinada função e moldando um modelo de sociedade maquinaria, para isso beberei da fonte de uma
discussão marxista e de sociólogos que pesaram em “modelos sociáveis” em que cada parte seleta do ofício
de trabalho, caberia a sua função singular e essencial na grande e complexa
máquina estatal que “controla” os homens.
OBJETIVO
GERAL
·
Compreender representações possíveis
acerca da problematização da discussão mecanicista sob a ótica cartesiana,
enquanto a moldagem da sociedade pelo homem e do homem por essa sociedade.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
·
Analisar de modo geral as imbricações
de uma realidade mecanicista do homem e
do meio social em que ele vive.
·
Compreender o homem como parte do
processo mecânico a partir de uma concepção cartesiana.
·
Estabelecer relações estruturais de
âmbito coletivo do homem enquanto parte seleta da máquina estatal.
·
Analisar as limitações da tese
mecanicista e seus efeitos perante os fatores econômico-sociais da sociedade.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Sob
um aspecto histórico o homem em sua condição de ser natural estabeleceu em
torno de toda existência de vida na Terra incontáveis vestígios que provam a
sua capacidade evolutiva e gradual a partir do tempo, a partir do momento em
que o homem normalizou suas ações e passou a agir coletivamente, começou por
assim dizer uma existência primitiva de uma hegemonia humana no reino animal,
hegemonia essa apenas possível por uma política social que permitisse uma arrecadação
de tributos e divisão dos saberes e técnicas de trabalho.
O
plano chave dessa fundamentação teórica creio ser a complexificação do homem
enquanto agente de um corpo social, uma parte seleta e importante no processo
social da sociedade antiga, seu trabalho pode ser substituído, mas no entanto
sua função não. Seja na área militar, social ou produtiva, o homem enquanto ser
individual estará condenado a uma vida sem grandes feitos e gradualmente
esquecida (já que nenhum homem é uma ilha), notoriamente alunos de história
podem naturalmente esquecer ou nem se quer ter conhecimento dos milhares nomes
que construíram o império do antigo Egito, mas provavelmente eles não
esquecerão que no norte da África existiu uma potência mundial na época,
atravessada por um extenso rio singular e rodeado por gigantescas pirâmides que
serviram de mausoléu para os soberanos, ou seja, o resultado dos esforços
desses homens serão o seu verdadeiro legado. Então pensar em uma sociedade
mecânica não é pensar em uma sociedade industrial e nem em uma sociedade sendo movido
por máquinas, o “mecânico” ganha um significado singular no sentido de que o
trabalho e o esforço dos homens em dividir as funções operacionais em âmbito
social, estabelecerem metas e planejamentos estruturais, além de uma economia
contabilizada (ou em um sistema de trocas comerciais bem orquestrada pelas
necessidades regionais). É o homem pensando na sociedade como uma “máquina”
para o seu manuseio.
Com
um olhar histórico não devemos levar esse pensamento mecânico ao pé da letra,
pois as relações servis entre o homem antigo e o estado que o compunha não são
relações formais e nem são relações de igualdade. O estado estava mais apto a
oprimir algumas parcelas populacionais do que outras (em uma máquina, mesmo que
engrenagens, válvulas ou pistões exerçam funções diferentes uma não pode
funcionar sem a outra, existindo certo “respeito” entra as partes maquinárias),
mas em uma sociedade humana isso não funciona bem assim e novamente tomando
como exemplo o mesmo Egito antigo, não há semelhanças sociais entre escravos e
escribas mesmo ambos sendo partes importantes no processo de solidificação do
estado egípcio.
Antes
de continuar o processo argumentativo da elaboração da tese mecanicista sobre a
mecanização do homem e do seu meio, além das relações interpessoais que os
mesmos exercem entre si, daremos um importante e gigantesco salto histórico, do
singular império egípcio em meados da Idade Antiga para o cotidiano da Idade
Moderna européia, onde o homem já definia uma relação bem mais madura com estado
no qual pertencia, porém devo salientar que não existem meios de compreender a
estrutura social como uma estrutura mecânica sem antes igualar o homem na mesma
perspectiva, e para compreender o homem como um “fator mecânico” necessitaremos
de Descartes, pois creio ser ele, a ponte de ligação do homem em sua relação
“mecânica” com a sociedade.
Há
algumas concepções cartesianas que diagnosticam o homem em sua biologia como
uma máquina corporal, no sentido médico em sua atualidade contemporânea, esse
estudo está totalmente refutado dos ensinos básicos da medicina humana, mas
sabemos que o mesmo Descartes que estudou a biologia humana com afinco também
era um filósofo, e logo percebo que “desenhar” o homem pressupondo uma máquina
(ao menos se adentrarmos no campo psicológico) não é totalmente errôneo,
vejamos a citação a seguir:
“Descartes comparou
o corpo dos animais a um ‘relógio (...) composto (...) de rodas e molas’ e
estendeu essa comparação ao corpo humano: ‘Considero o corpo humano uma
máquina. (...) Meu pensamento (...) compara um homem doente e um relógio mal
fabricado com a idéia de um homem saudável e um relógio bem-feito. ’ (RODIS-LEWIS,
1978)”.
Se
for errado ou não comparar corpo humano a um relógio nisso eu prefiro não
comentar, mas e se em vez do corpo biológico assemelhássemos o homem enquanto
objeto da história aos ditames do relógio, o que se poderia pensar a respeito
dessa conclusão? No caso histórico, o homem não seria só detentor dos aspectos
maquinários do relógio, mas também do seu aspecto simbólico que seria o
“tempo”. Mesmo se o ser humano não existisse o tempo passaria da mesma forma
sob as rotações terrestres seguindo suas próprias leis universais, mas sob a
perspectiva cartesiana do homem-relógio, logo existirá uma série de conflitos
na história sob o tempo fabricado e fabricando o homem. Para compreendermos
melhor o fascínio de Descartes por uma ideologia mecânica, devemos nos situar
no contexto da época moderna em que o mesmo vivera. Na Europa moderna surgira
uma nova fase científica para o homem, o Renascimento,
por assim dizer condizia ao homem não mais a imutável explicação teológica de
como tudo funcionava, e sua principal característica é o chamado antropocentrismo como a figura primordial
de como o homem devia ver o mundo, a partir de uma concepção voltada ao
universo humano.
Com
um lento avanço na medicina (principalmente com a popularização do ato de
dissecar cadáveres), começara-se por perceber que o corpo humano não é um copo divino
e organizado de um modo especial pelo deus cristão da Europa ocidental, e
quando Descartes estuda melhor esse corpo humano perceberá nele uma sincronia
perfeita dos órgãos vitais com todos funcionando em perfeita comunhão com o
órgão cerebral os guiando. Na proposta cartesiana o homem enfermo por quaisquer
que sejam os motivos, está em plena desvantagem do homem funcional, Descartes
não notabilizou este princípio as relações de trabalho com o estado, se
limitando apenas ao fator biológico do “homem mecânico”, mas se esse homem
enfermo tivesse reparado suas peças corporais de uma maneira não desgastante e
tentado prevenir essa situação de uma maneira mais responsável possível (isto
é, se aplicarmos a analogia do relógio), teria ele conseguido fazer funcionar
um relógio mais eficiente e tal como um “relógio”, seu tempo de vida igualmente
aumentaria. Aplicar a perspectiva cartesiana da relação homem-relógio é
trabalhar não só com fatores biológicos, mas também relações de trabalho entre
os homens e com o estado (a existência do tempo de trabalho em sua
relatividade) é perceber o homem de uma maneira pré-evolucionista (já que o
“relógio” mais eficiente triunfará sobre o relógio claramente defeituoso) e com
uma abordagem filosófica das nossas “predisposições” a fazer algo de uma
maneira previsível (nessa parte vemos a conexão da história do homem com sua
capacidade de repetir constantemente o passado).
Portanto
o exato sentido da “mecanização” do homem em sua individualidade na proposta
cartesiana da época moderna culminou para aquele de quem lida com a história em
si enxergar alguns fatos na história humana que são passíveis de serem pensadas
sob um ponto de vista mecanicista, outrora bem anterior a Descartes, além de
conjugar essa perspectiva individual para uma abordagem de âmbito coletivo como
a mecanização do “meio” pelo homem, ou do “homem” pelo meio, por intermédio da
relação de contrato social enfatizado por John Locke ou pela análise marxista de
enxergar o operário como detentor dos direitos dos meios de produção (a partir
da ótica do materialismo histórico), como também aplicado aos ditames do
capitalismo financeiro do século XX.
Contudo
não basta perceber apenas as dimensões cartesianas do pensamento mecanicista do
homem, já que como falei anteriormente e vale à pena ressaltar de novo, não
devemos levar a questão da mecanicidade humana ao pé da letra, diagnosticar a
perspectiva mecanicista na sociedade humana só pode ser possível quando lidamos
com apenas algumas disciplinas acadêmicas do conhecimento humano, e aplicar a
lógica cartesiana (onde tudo deve ser dissecado e estudado minuciosamente a
partir de partes isoladas do processo) sincronizou perfeitamente com o estudo
histórico da sociedade no tempo, pois a capacidade de separar fatos e
investigá-los de maneira detalhada e isolada do processo como um todo, é
basicamente o trabalho do historiador. No mais, a mecanicidade do homem
enquanto sujeito histórico será apenas tomado pelo ponto de vista coletivo,
aliás, ninguém faz história sozinho na perspectiva de desenvolver rupturas
sociais e políticas de acordo com seu tempo, penso que será as definições
oriundas na mecanicidade do homem e da sociedade, que passaremos a enxergar um
novo tipo de conhecimento histórico, uma escola do conhecimento que está mais
preocupada em entender a funcionalidade repetitiva presente na história, do que
a análise de um fato isolado na história.
O
trabalho do historiador mecanicista consistirá em analisar de uma forma mais
“cartesiana” possível as diferentes partes do processo e suas conexões com as
partes anteriores, e frequentemente imaginar (com certa criatividade talvez) o
espaço histórico dos novos fatos. Como exemplo, podemos averiguar os processos revolucionários
que se mostraram presentes no contexto “geral” da história, tais revoluções em
seu contexto singular são distintas uma das outras (pelo menos nos seus fatores
mais superficiais), porém a ideia central e presente na raiz dos acontecimentos
se conectam com outras perspectivas revolucionárias a partir do espírito de
revolta, o anseio por mudanças (estruturais ou não), além de um profundo desejo
de fazer valer a “voz” dos revoltosos mostrando sua existência para a
sociedade. Portanto estas estruturas centrais estarão preservadas na
sistematização histórica, seja em processos revolucionários, ou em tirania
absoluta, e talvez no próprio poder de decisão de uma nação, a máquina
infalível da história nos apresentará tendências que serão incorporadas em
vários povos, mas também tendências que poderão ser revisadas a partir de um
modelo atual, ou simplesmente abandonadas e deixadas para morrer se o conteúdo
se mostrar impróprio para o cotidiano social, econômico, ou político da
sociedade.
Para
finalizar minha argumentação a respeito da tese mecânica de como o homem passa
de “ser” natural para um “ser” mecânico e sistemático, há basicamente o
discurso evolucionista que serve como base, mas também existe o discurso da
capacitação do homem através das diferenças, sobretudo quando ele adquire
habilidades e técnicas que lhe põem em clara vantagem perante o meio animal, a
partir de uma incorporação de experiências com outros povos, será esse o
diagnóstico mais preciso que posso fazer no que creio ser o “atributo da
mecanicidade”, saber analisar os defeitos das partes da máquina em comparação a
uma máquina mais produtiva e eficiente, se aperfeiçoar de um modo organizado
planejado, conseguindo assim colher os frutos do empreendimento da mudança. A
assimilação do conhecimento histórico tal como um ciclo de repetições de
momentos na história humana é um meio de cientificar o modelo histórico a
partir de uma hipótese histórica, que permite enxergar uma reinterpretação do
modo de fabricar o conhecimento histórico.
Thomaz Caetano,
Licenciado Pelas Faculdades Integradas de Patos.
Licenciado Pelas Faculdades Integradas de Patos.
REFERÊNCIAS
CAPRA, Fritjjof.
The turning point: Science,
Society, and the Rising Culture. Flamingo Press, 1990.
DESCARTES,
René. Discurso do método.
2ª ed. Lisboa: Guimarães Editores, 1994.
DESCARTES,
René. Princípios
da Filosofia. Lisboa: Presença, 1995.
RODIS-LEWIS,
Geneviève. Descartes: Textes et
Dèbats, Livre de Poche, 1978.
MINDWALK,
Dirigido por Bernt Capra. Produzido por Klaus
Lintschinger. Estados Unidos: Triton Pictures, 1990. (112 min.): VHS;
Ntsc; son; color. Legendado. Port.
Parabéns pelo discurso, ficou espetacular.
ResponderExcluirvaleu!
ResponderExcluirvaleu!
ResponderExcluirQueria saber se vc pode disponibilizar a imagem da capa do site, mas sem o texto, tem como?
ResponderExcluirShow
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